quarta-feira, 17 de junho de 2009

A crise depende de humor


por Diogo Antonio Rodriguez

Quais são os limites da crise econômica atual? Essa é a pergunta de um trilhão de dólares – porque um milhão já não significa mais nada hoje em dia. Vemos que, por enquanto, o país dito mais avançado do mundo tem recorrido a soluções antes inimagináveis para um tipo de discurso que, a partir do anos 70, rejeita a intervenção estatal veementemente. É tentador relacionar tais medidas com as apontadas por Hunt e Sherman – investimentos estatais maciços para compensar os efeitos devastadores do crash da bolsa de Nova Iorque, em 1929. O governo americano está se tornando o maior acionista de grandes empresas que não têm condições de se manter, socializando as perdas. Será, há semelhanças entre as medidas keynesianas e as de hoje?


Difícil dizer. Mas o fato é que as diferenças estruturais não permitem uma comparação por analogia. Nos anos vinte americanos, a economia não se encontrava tão mundializada como dos nossos dias. Os mercados já funcionavam com ações, com capital financeiro, mas a produção ainda era o centro nervoso e muscular do mundo. Investiu-se na criação de empregos e no fortalecimento do sistema produtivo: construção civil, grandes obras públicas, fábricas que produzem bens de consumo. O panorama de hoje é bem diferente. E não é algo recente. Mesmo na crise de 1973, o sistema econômico mundial já estava em estado avançado de integração e interdependência. Bursztyn, Chain e Leitão mostram que “onda recessiva” não tardou a chegar no Brasil e em outros países “subdesenvolvidos”.

Só que naquela época, o mundo ainda vivia em uma certa nostalgia da suposta Divisão Internacional do Trabalho, na qual cada conjunto de países teria sua função no mercado mundial. A do Terceiro Mundo seria a de produzir manufaturados baratos e exportar matérias-primas para serem beneficiadas em empreendimentos industriais mais complexos no Primeiro Mundo – detentor das tecnologias. Éramos meros replicadores e receptores das inovações. Isso não mudou muito em termos. O grande problema é que hoje existe um centro de referência da confecção de manufaturados, que é a China. Ela tem capacidade de desempenhar esse papel de maneira quase que absoluta.

Alem de nao haver mais uma direcao necessaria para o escoamento das producoes, as relacoes economicas estao interligadas. Se nos anos 70 as crises tomavam dimensoes nacionais porque os mercados de importacao e exportacao dependiam de varios paises, hoje, os sistemas financeiros sao altamente responsivos a qualquer mudanca em qualquer economia. E pior, nao se trata mais so das industrias e produtos, mas sim de credito e dividas que nao podem ser pagas. Fala-se muito no humor de mercados, e essa e uma realidade. Ao se sublimar as transacoes e o dinheiro, criou-se um meio de circulacao quase sem limites, no qual empresas que nada tem a ver com emprestimos imobiliarios comprar titulos de dividas indiscriminadamente. Sem regulacao, sem parametros, submete-se a economia (e a politica, e a sociedade) a uma fragmentacao sem limites. Nao so mais as relacoes de trabalho ficam moduladas, como bem apontou Giles Deleuze, mas tambem toda a economia. Por isso, e possivel a piada dos comediantes Bird and Fortune sobre a crise economica mundial:


Temos entao um panorama de incertezas. Nao se sabe ainda se a formula de Keynes podera dar conta da crise atual (provavelmente nao), nao se sabe o quanto as economias nacionais serao afetadas em decorrencia da crise mundial (bastante afetadas, provavelmente). Sabe-se agora, com certeza, duas coisas: nao adianta so manter um nivel de investimento constante feito pelo Estado - como no caso dos EUA, que mantem gastos militares elevados e que e necessario impor limites a parte da economia que se tornou autonoma - o sistema financeiro. Ficamos com mais uma pergunta, portanto: sera que adianta o governo dos EUA comprar a GM para impedir a derrocada da economia americana?

A resposta parece estar em Bird and Fortune.

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