segunda-feira, 30 de novembro de 2009

O papel da internet e a enciclopédia de papel

No início da minha vida escolar, não existia nada melhor que a enciclopédia para estudar e fazer os trabalhos pedidos pela professora do ginásio. Eram vários livros de diversas coleções. As cores eram vibrantes e em pouco tempo já sabia qual tema estava em qual volume. A biblioteca ficava na garagem, não por ser indigno dos ambientes mais visitados da casa, mas pelo silêncio que o cômodo proporcionava. Mesa, luminária, canetas, várias folhas, marcadores de páginas e pronto. Bastava encontrar o livro. Digo encontrar, pois acreditava não haver temas abordados na escola que não estivessem nos livros vermelhos de capa dura, ou nos verdes com folhas já amareladas que cortavam os dedos de quem não tivesse cuidado ao folheá-las.

Com o passar dos anos percebi que os trabalhos escritos à mão deram lugar aos impressos pelo computador, e que eram cada vez maiores, com figuras coloridas, cheias de legendas. As notas dos meus trabalhos, feitos com base na enciclopédia e escritos à mão passaram a receber notas cada vez mais baixas. O conteúdo estava errado? “Não!” - dizia a professora. “Apenas comparando com o dos seus colegas, o deles está muito mais completo.” Esse foi o primeiro momento que senti a necessidade de um computador com acesso à internet.

Idealizada e desenvolvida às luzes das ideias iluministas francesas, o projeto da Enciclopédia (de D'Alembert e Denis Diderot) foi inovador. A maior inovação veio pelo formato adotado: o método do dicionário, organizando os artigos por ordem alfabética. Em cada tópico era apresentado o campo de conhecimento ao qual ele pertencia. O recurso mais inovador, porém, foi a chamada referência cruzada.

A referência cruzada é inter-relacionamento de temas, ou seja, um tópico remete a outro tópico relacionado ao mesmo tema. Nos dias de hoje, o conceito pode ser comparado a um tema relacionado na página de pesquisa ou ao hiperlink, comum em páginas da internet, principalmente na Wikipédia. Este recurso aumenta o leque de pesquisa sobre o tema e amplia a abordagem do tema.

Os autores de "Informação e Sentido" e "O projeto da enciclopédia e seus registros sobre o jornalismo", Paulo Serra e Antônio Hohlfeldt, respectivamente, recontam a criação da enciclopédia como uma forma de eternizar e registrar a memória. A enciclopédia é, nada mais, que um grande arquivo de história, geografia, política, ciência, enfim, do conhecimento humano que seus criadores acharam pertinente estarem contidos nesse registro.

A inovação não foi apenas em sua concepção. A enciclopédia representou também um marco na evolução das formas de organização do saber. Ao identificar que o conhecimento tradicional estava baseado em superstições e preconceitos, seus idealizadores apostavam na razão como único meio para se chegar à verdade. A partir dessa filosofia, houve o rompimento da versão católica da revelação como base da ciência.

O processo enciclopédico representava a institucionalização dos dados organizados a partir de uma única visão, de certa forma inquestionável e inalterável. A Internet veio a resolver alguns dos problemas enfrentados pela enciclopédia. O primeiro deles é a infinita capacidade de armazenamento. Com espaço ilimitado, nenhuma informação era descartada. Não havia mais necessidade de adequar-se a um espaço delimitado por bordas de livros. Foram eliminados também os problemas de desatualização, já que o conteúdo publicado pode ser alterado a qualquer momento. Reduziu-se ainda, e muito, o tempo de pesquisa. Se a cada atualização de conteúdo, fosse necessário editar uma nova versão da coleção, esta jamais ficaria pronta. A publicação da primeira edição consumiu mais de 20 anos de seus escritores. Quando chegassem às lojas, não era de se espantar que algumas informações já estivessem ultrapassadas.

A popularização da pesquisa online e a inserção livre de conteúdo não fiscalizado causaram um novo problema, até então desconhecido e, no início, de difícil compreensão por algumas pessoas: a falta de credibilidade das fontes contidas na internet.

Resultados de pesquisas no Google reúnem milhares de fontes, sem discernir a idoneidade de cada uma delas. Compila todos os resultados encontrados, incluindo blogs e comentários pessoais. Em páginas como a Wikipédia, cujo slogan é “a enciclopédia livre”, qualquer um pode consultar e até alterar o conteúdo das páginas. Se por um lado isso democratiza a informação, por outro gera dúvidas e desconfianças do que pode ou não se confiar. Podendo optar, ainda fico com a atualizada, mesmo que não 100% confiável, internet. Já dizia minha professora do ginásio.

(Aline Boniolo - 06004503)

A credibilidade da informação na era virtual

Evandro Ruivo


As informações que circulam no ambiente da rede mundial de computadores têm papel fundamental na formação crítica do mundo contemporâneo. Sites, blogs, e afins, são formas modernas de acesso e troca de informação, porém esbarram no mesmo problema de sempre, a fonte fornecedora.
O indivíduo pode acessar e ser acessado por milhões de pessoas. Os números são estratosféricos. A aparente ilimitação da circulação de conteúdo esbarra na chamada “superexposição”, invertendo o papel inicial que era o do acesso irrestrito às informações.
Os iluministas D’Alembert Diderot, artífices da “Enciclopédia Francesa”, tentaram racionalizar uma maneira de reunir e popularizar o conhecimento humano, compilado até aquele momento. Dentre outras evoluções na agregação desse conhecimento, eles iniciaram a forma cruzada de pesquisa de informações. Anteciparam em mais de um século a formatação que hoje a rede mundial de computadores utiliza. Desse modo, a pesquisa de verbetes na internet parece infinita, como desejavam os enciclopedistas. Naquele tempo, os realizadores da Enciclopédia tinham como base os empiristas John Locke e Francis Bacon. E ainda como colaboradores atuantes, nomes do calibre de Voltaire, Rousseau e Motesquieu.
Como todo texto impresso tem suas limitações quanto à atualização, além de outros problemas com a formatação, o modelo proposto pelos enciclopedistas foi questionado e relegado ao segundo plano, especialmente pelas novas enciclopédias surgidas a partir dos anos 70.
Paulo Serra, no texto “Informação e Sentido – Notas para uma abordagem problemática do conceito de informação”, esclarece as limitações e falhas no processo. De início, vislumbra a impossibilidade de rápida atualização, haja vista que a Enciclopédia demorou cerca de 22 anos para ser completada.
A atualização também traria outro inconveniente ao espírito da concepção original, qual seja, deixaria de ser um resumo de aspectos e fatos relevantes do conhecimento, demandando maior volume de páginas.
Um outro problema detectado por Serra é o critério para a escolha da organização sistemática. Segundo o autor, se adotarmos qualquer método, dentre a infinidade disponível, estamos fazendo-o aleatoriamente, arbitrariamente. Disto decorre outro problema: a escolha da informação a ser prestada. Como separar as informações de cunho científico e cultural das meramente cotidianas.
A rede mundial de computadores poderia solucionar estes problemas. Quanto à atualização, esta é cada vez mais instantânea, relegando o tempo de emissão e recepção a segundos. Como o campo de pesquisa é quase ilimitado, a rede de computadores não necessita fixar um método de organização e sistematização para obtenção do conhecimento. As variáveis de pesquisa e método são quase infindáveis.
O terceiro problema seria a capacidade de armazenar todo e qualquer conhecimento. A solução é obtida pela rede de computadores, pois esta elimina a necessidade de um suporte material para abrigar as informações. Decorre daí outro problema atualíssimo, que é o excesso de informações.
Segundo Serra, a perda do sentido da informação é o contraponto das soluções que a rede de computadores trouxe na busca pelo conhecimento. Lembrando a lição de Platão, Serra demonstra o paradoxo de que, se não tem conhecimento sobre o que fazer com a informação, esta de nada serve. Funes, o memorioso, de Jorge Luis Borges, releva a personificação da realidade virtual que estamos vivenciando. Nada adianta ter tanta informação armazenada, se o sentido lhe escapa. Não adianta ter acesso e arquivar tantas informações, sem o correspondente sentido. O sentido que Funes não conseguia dar à quantidade infinita de informações e detalhes que memorizava naturalmente, ou pelo esforço de relembrar as passagens de dias inteiros.
Por outro lado, o hipertexto virtual encerra a finalidade que os enciclopedistas pretendiam. As diversas formas de organização e sistematização do conhecimento estão contidas na rede de computadores. O projeto enciclopedista avançou mesmo um século depois de pensado. Desde o Memex de Vannevar Bush até o World Wide Web, de Tim Bernes-Lee, o enriquecimento cultural da humanidade encontra-se no Projeto enciclopedista. Uma das diferenças essenciais é que na Enciclopédia, os autores escolhiam as informações baseados em um conjunto de sistemas interdependentes entre si. No hipertexto, estas escolhas são fragmentadas, fugindo do conjunto sistematizado de organização do conhecimento.
Nos últimos 50 anos, a humanidade evoluiu tecnologicamente, mais do que em toda a sua história. Com essa evolução e o acúmulo de conhecimento, esperava-se uma certa emancipação da população como um todo, a ponto de o conhecimento ser acessível à, pelo menos, maioria dos povos do planeta. O que acontece é exatamente o contrário. A revolução tecnológica de ponta concentra-se nas mãos de poucos. Essa concentração também se verifica na rede mundial de computadores. As grandes corporações, incluindo os meios de comunicação de massa, entupiram o sistema, fragmentando as informações e dando a aparência de uma democratrização do conhecimento. O jornalismo tem papel de suma importância na intermediação entre a coleta de dados e o sentido a ser dado àquela informação.
O registro, a conservação e a transmissão da informação, como queriam os enciclopedistas, ainda não foi realizado pelo tráfego virtual. Carece de acesso múltiplo a uma cultura social de maior amplitude e maior alcance. Enquanto o sistema estiver restrito a uma parcela minoritária da população, não haverá emancipação da sociedade, quer por meio do papel impresso, quer por meio vitual.
O que hoje realmente atrapalha o desenvolvimento na troca de informações no hipertexto é exatamente o excesso inconsequente de dados na rede de computadores. A maioria das fontes emissoras de informações colocadas no sistema virtual ainda carecem de credibilidade. A responsabilidade, a ética, a veracidade, dentre outras questões humanas, ainda não estão na pauta das fontes originárias das informações arquivadas na internet.

domingo, 29 de novembro de 2009

O esforço para esquecer

(André Avelar - 06000487)

Ao longo dos anos, seres humanos utilizavam as mais variadas técnicas para “lembrar”. Pois hoje, sobretudo com o advento da Internet, o desafio é justamente o contrário: a tarefa agora é “esquecer”. Esse debate, retirado das profundezas das redes sociais, encontra a validade empírica sempre quando necessária uma busca sobre qualquer que seja o assunto. Diante da enxurrada de endereços eletrônicos com informações nem sempre confiáveis, nem sempre plausíveis, nem sempre verdadeiras mesmo, o leitor se vê perdido em uma infinidade nada democrática ou emancipatória, como defendem teorizadores que beberam da mesma fonte dos iluministas.

Desde a Enciclopédia Francesa ou Encyclopédie, de Jean le Rond d´Alembert e Denis Diderot, os Homens tentam reunir o passado, sabendo que estão fazendo recortes na História e, assim, constituindo talvez, a forma oficial de uma espécie do “tudo que deveria ter sido e não foi”. A produção da memória, separadas em ordem alfabética e por tópicos, tinha também um quê de desorganização na mesma proporção da atual explosão da informação, igualmente excessiva e fidedignamente improvável. Bem por isso, o fracasso do projeto do primeiro, neste momento, em relação ao segundo.

A Enciclopédia existiu sem saber que era a própria morte anunciada. Não por falta de vontade ou critério, mas pelas limitações impostas pela época de forma que pouco tempo se passava e ela já estava desatualizada e resumida. Além disso, a legitimidade da escolha de um argumento baseado no lembrar de seus criadores e, ainda, a relevância ou não dos temas sugeridos, como aponta Paulo Serra, em Informação e Sentido – Notas para uma abordagem problemática do conceito de informação. Para o autor, problemas como esses se repetem aos ciclos e a verdade estará entregue à mão de quem a assina. Em suas próprias palavras, “o projecto dos Enciclopedistas desemboca, assim, numa contradição (aparentemente) insuperável: de um lado, uma informação que merecia ser memorizada, mas que, dada a sua exponencialidade e sua hiper-complexidade, se torna impossível memorizar”.

Nas ruas, esse fim das enciclopédias como um todo aconteceu em meados da década de 90. Quem não se lembra daqueles bravos, porém inconvenientes vendedores da Barsa que batiam de porta em porta, sempre no horário do jantar, da final de campeonato, ou mesmo, no último capítulo da novela? Era difícil se desvencilhar deles até que, mais precisamente em 2001, surgiu o que em pouquíssimo tempo se tornou o maior site de buscas: o Google, sinônimo até de pesquisa, sendo capaz, inclusive, de aceitar uma péssima conjugação verbal, por exemplo.

Esse talvez tente reunir toda a memória da publicada na Terra, mas não raro cai em descrédito por mau uso da informação, se deixando levar por um consumo imediato e esforço para o esquecimento instantâneo do outro. Ali está um produto que não se sabe a origem, os interesses por trás e, nem mesmo, a tradição. Esse excesso de memória se assemelha à ficção de Jorge Luís Borges, em “Funes, o memorioso”. Nele estão todos os registros, notas, sentimentos, sensações que apesar de belo, fica impossível de distinguir o memorável do desprezível. Bem comparando, o material útil do lixo eletrônico. Em outras palavras, não existe o filtro.

E é exatamente nesse filtro que os grandes portais de comunicação estão justamente empenhados. Arquivos de jornais seculares começam a ser disponibilizados na íntegra na tela do computador, livres para a consulta de seus assinantes – pois sim, o conhecimento tem um valor e ele é pago em espécie. Ainda que uma versão do fato, ou melhor, uma visão do fato acontecido, pelo menos se pode confiar que ali está em jogo toda uma história, que por incansáveis vezes passou pelo crivo da sociedade e, mais do que isso, resistiu ao tempo. Nada nada um peso que os demais links apresentados pelo buscador não têm. De novo, um esforço para esquecer.

Mas nem assim é justo culpar a acessibilidade aos computadores, a inclusão digital ou as redes sociais pelas milhares e milhares de páginas com registros por vezes distantes do que se está procurando. Aí reside justamente a Internet. O infinito armazenamento, sem limites físicos, está intrínseco ao seu uso, seja ele relevante ou não. Mesmo nos pormenores de cada busca, há algum tipo de informação. O cuidado deve estar em saber lidar com essa informação.

Como nas conhecidas palavras de Jean Baudrillard, “estamos num universo em que existe cada vez mais informação e cada vez menos sentido”. Uma possível solução para esse impasse, também presente no trabalho de Serra, é a linguagem do hipertexto, a frequente atualização e, sobretudo, o conhecimento do usuário de separar o que aleatoriamente aparece para ele. Um otimismo que ainda não leva em conta as técnicas utilizadas e a máquina plenamente falível que é a memória.

Quem melhor tenta explicar essa contradição em termos é Olga Pombo, em Enciclopédia e Hipertexto – O Projecto. Ela deixa claro que esse não é um processo que se aprende ou ensina, mas explica que a relação entre “as diferentes formas de organização da totalidade do patrimônio cognitivo de uma época (enciclopédia) e as técnicas de reenvio virtual entre todos os conceitos ou todos os endereços conservados nos servidores de todo o mundo (hipertexto) é mais fundamental do que aparece de forma imediata”.

O hipertexto, segundo a autora, é uma aposta do saber em permanente crescimento, daquilo que em outros tempos foi o saber adquirido até certo ponto. Não está em jogo uma unidade fechada, mas algo sempre inacabado, em constante construção apenas pela contribuição. “Não perder o detalhe, de estar atento ao singular, ao irrelevante, ao insignificante” não apenas por mero estilo – separação nítida no jornalismo diário e na sua forma mais literária –, mas ter consciência daquele material que está se utilizando e ter o devido cuidado na hora de distribuir, além do conseqüente esforço para o esquecimento dos demais tópicos não-utlizados.

Iluminadas sejam as verdades

Natália Pesciotta (06000516)




A jornalista Sylvia Moretzsohn termina o livro Pensando Contra os Fatos com uma imagem: uma mulher, segurando uma vela, caminha no breu. Ela é engolida pela escuridão, mas ilumina as trevas por onde passa. Para a autora, essa mulher representa o jornalismo. A metáfora da luz como informação é recorrente. Quem lê o texto Informação e Sentido, de Paulo Serra, logo resume: “o excesso de luz causa cegueira”, para referir-se à multiplicidade e quantidade de informação ao qual estamos submetidos hoje. A princípio, uma ideia trata de escuridão e outra de claridade, mas, na verdade, as duas apontam para um mesmo sentido.

A vela do jornalismo descrita por Moretzsohn nada mais é do que o próprio Iluminismo. O formato da profissão nasceu – assim como o projeto enciclopedista de d’Alambert e Diderot, analisado por Serra – com os ideais do século 18, que buscavam dar luz aos conhecimentos humanos, organizar e divulgar saberes, depois da humanidade ter vivido a escuridão na Idade Média. Uma Idade Moderna se passou e, três séculos depois, Moretzsohn reafirma essa função do jornalismo – exatamente pelo fenômeno de “excesso de luz” explicitado por Serra.

Segundo a argumentação dele, as pessoas convivem com a propagação de tanta informação veloz, sem articulação, que deixam de ser capazes de memorizá-las e, assim, assimilar os conceitos e relacionar idéias. Essa cegueira seria, e aí está a convergência das imagens, a volta à escuridão. Para diversificar um pouco a metáfora, o filósofo francês Lipovetsky escreveu que nossos tempos pós-modernos são o “looping da montanha-russa”. Depois da ascendência Iluminista, comparada à subida do carrinho nos trilhos, a humanidade teria começado a perder o controle na descida e encontrado-se em total inércia no “looping pós-moderno”. Quer dizer, toda a tecnologia criada e a evolução na comunicação teria nos levado ao descontrole, à tal cultura do esvaziamento.

Num tempo em que interação é palavra de ordem e todos têm direito à voz ao comentar notícias ou criar um blog, por exemplo, a teoria da comunicação tradicional – com emissor, receptor, meio, mensagem – entra em desuso, defendem alguns. A ruína da epistemologia, contudo, não é necessariamente negativa. Há quem indique a Internet, responsável pela pluralidade de vozes e intensidade da troca de informações, como o auge do pensamento iluminista. É o caso de Olga Pombo, de Enciclopédia e Hipertexto, o Projeto, para quem talvez a Wikipedia fosse o sonho dos criadores da Enciclopédia.

Além disso, outros acreditam que a comunicação sem a epistemologia tradicional caminhe contra a institucionalização de “fontes confiáveis”, impostas pelos contratualistas e pelo projeto enciclopedista. Uma enciclopédia ou certos veículos da imprensa como guardiões da verdade absoluta, afinal, significa a pasteurização dos vários pontos de vista e vozes existentes na sociedade. Rosseau, um contratualista, já percebia que a imprensa esvazia o espaço público desde que foi idealizada para representar as discussões da sociedade. Nesse sentido, a abertura de canais que vivemos pode ser o caminho para um espaço público mais autêntico.

Uma palavra precisa estar no dicionário para existir? Darei um exemplo prático: o sobrenome Silva é usado como indicador de intensidade (“ele é doidinho da silva”). Quando escrevi uma matéria sobre os sobrenomes no Brasil, frisei que nossa alcunha mais difundida está “até no dicionário”. Pensando sobre o assunto, não vejo com maus olhos a institucionalização da informação. É importante que existam referências e que os saberes do cotidiano sejam balizados. Já aceitamos, afinal, a democracia representativa em detrimento da participativa.

A Barça e a Larrousse devem trazer informações sobre Diderot, D’Alemberg, Paulo Serra, Enciclopédia e, nas versões mais atualizadas, até sobre Hipertexto. É importante que possamos tê-las como referência para checar informações. Mas, atualmente, há um porém: basta digitar as palavras no Google para saber o que pensam também todos os estudantes de jornalismo aqui listados, por exemplo.

É inegável que a exclusividade de meios oficiais para propagar conhecimentos aniquila a pluralidade da sociedade. Diria que a mulher com a vela, na imagem de Moretzsohn, é essencial, mas a sociedade não é mais refém de seu ponto de vista sobre o que deve ou não ser iluminado. Por todo canto, sites, blogs e redes sociais se acendem, como fósforos, para informações que julgam relevantes, e passam a guiar a mulher que segura a vela. Dessa forma, talvez, possamos nos livrar da escuridão e da cegueira.

Internet: A Enciclopédia Moderna

Ana Carolina Castilho
06004504

A enciclopédia é uma magnífica obra do iluminismo francês e europeu. Ela foi publicada entre 1751 e 1780, em 34 volumes, como uma fonte de conhecimento e não de revelação. Seus principais autores foram Jean D’Alembert e Denis Diderot. A enciclopédia serve para descrever o mais aproximado possível o relativo à concepção do conhecimento humano e Segundo Paulo Serra, em seu texto “Informação e Sentido”, os objetivos de Diderot era reunir o conhecimentos dispersos pela Terra e deixar para as gerações seguintes todos os feitos de sua geração, a fim de evitar que as ações dos séculos passados não se tornassem trabalhos inúteis. Claro, naquela época não era possível colocar todas as informações, assim, elas eram selecionadas pelos seus editores e entravam aquelas mais os interessavam, deixando para trás fatos que deveriam ser esquecidos na opinião deles. Esse fato, restringiu muita informação e construiu, como Paulo Serra cita em seu texto, uma nova memória.

O tempo foi passando e mais e mais informações foram sendo acrescentadas. Os livros iam aumentando, as enciclopédias ganhavam mais volumes, novos fatos se tornavam conhecidos, até chegar nos grandes livros que conhecemos e que a maioria tem guardados hoje no fundo do baú de casa.

Lembro-me direitinho dos dias em que eu passava o dia atrás de livros, pesquisando sobre um determinado tema para entregar, em uma folha de almaço, um trabalho para a minha professora. A enciclopédia “Conhecer”, e a “Grande Enciclopédia Larousse Cultural” fizeram parte do meu ginásio e me garantiram boas notas. Porém, há anos não ouço mais falar das minhas salvadoras do passado e há anos não chego perto de uma. Nem imagino onde elas estejam guardadas na minha casa. Isso porque a internet foi chegando às casas dos brasileiros e sem nem pedir licença, expulsou as velhas enciclopédias para dar lugar a outras mais modernas, mais completas e muito mais fáceis de usar.

O declínio das grandes enciclopédias em livros começou com a chegada das enciclopédias em CD-ROM. Nesses CDs cabiam todas as informações necessárias para que estudantes, pesquisadores e curiosos achassem o que queriam. A vantagem era a portabilidade e a rapidez, além de ter uma produção econômica, animações e até áudio. Foi então que apareceram os hiperlinks, ligando artigos relacionados e aumentando o poder da busca. Então chegou a internet, citada acima. Com ela, vieram as enciclopédias livres, onde qualquer pessoa poderia contribuir com o seu conteúdo, ampliando de maneira absurda a quantidade de informação e criando um banco de dados universal, que é aperfeiçoado continuamente.

Hoje grande parte do que se deseja saber está na internet. Precisa fazer um trabalho para a escola? Precisa entender mais sobre um determinado assunto? Busca no Google! Com um computador e a internet é possível armazenar muita coisa e aprender muita coisa. Tudo é muito rápido. Não se trata somente de artigos de enciclopédia, mas sim de tudo que está acontecendo no mundo. A notícia na internet é imediata. Em questão de minutos podemos saber o que está acontecendo do outro lado do mundo. E não são só de informações úteis que vive a internet. Hoje, uma cultura inútil toma conta de importantes sites de informação. Somos bombardeados por notícias dos mais variados assuntos e muitas delas não nos acrescentam nada.

Toda essa tecnologia tem seu lado negativo. O que estrutura a sociedade hoje é a comunicação, todas as nossas relações sociais estão estruturadas por ela e essa nossa sociabilidade se localiza no cotidiano, que é fragmentado em um universo muito grande de demandas. O problema é que hoje em dia, as informações devem ser passadas o mais rápido possível, o jornalista deve produzir grandes quantidades de notícias em pouco tempo. Há um dinamismo e produtivismo muito grande, deixando o jornalista sobrecarregado e assim a notícia acaba não sendo boa nem para quem escreveu, nem para o leitor.

O jornalismo precisa lidar com a imediaticidade dos fatos e ao mesmo tempo com a vida cotidiana para nos fornecer elementos para que possamos fazer uma crítica sobre o assunto. As notícias de sites como UOL, GLOBO e etc, nos servem como uma enciclopédia moderna, que nos dá base, mas não nos aprofunda.

Tanta informação pra quê?

Por Bruna Zibellini - 06000491

Em 1998 a dupla de estudantes Larry Page e Sergey Brin lançou o Google. Três anos depois, em 2001, Jimmy Wales e Larry Sanger lançaram a Wikipedia. O que essas duas ferramentas têm em comum? São os maiores sites de busca do mundo. O Google é aquele em que você encontra tudo sobre tudo e todos. “Não sabe? Joga no Google.” A Wikipedia é uma “enciclopédia livre” como diz o próprio site. Isso significa que qualquer um pode modificar o seu conteúdo.

Tanto o Google como a Wikipedia “roubaram” o antigo formato de enciclopédia criada por Santo Isidoro no século VII. Segundo Olga Pombo, a internet é “a versão dessacralizada do esforço de contenção dos conhecimentos que, nessa primeira enciclopédia cristã, Santo Isidoro tinha conseguido arrancar às cinzas do império romano”. A autora ainda afirma: “Sabemos que o texto da enciclopédia é descontínuo, composto de entradas independentes organizadas segundo critérios de ordenação alfabéticos, temáticos ou disciplinares”, da mesma forma que esses sites atuam.

As enciclopédias (digitais ou não) estão organizadas de uma maneira que contém, além de elementos textuais, elemnetos visuais, como gravuras, desenhos, ilutrações, mapas, cartas, mapas, tabelas e fotografias, o que caracteriza a composição geométrica do hipertexto. Segundo Pombo, “o hipertexto é o dispositivo que permite conectar em rede as informações disponíveis em todos os servidores do mundo”, e isso potencializa a última ideia de enciclopédia. São muitas informações interligadas, e diferentemente de como fazíamos antigamente, que era só abrir aquela Larousse capa dura e procurar uma verbete, tudo está ao nosso alcance com apenas um click.

Em “Funes, o memorioso”, de Jorge Luís Borges, o jovem Irineu Funes pode ser usado como uma mtáfora ao hipertexto, já que, após o seu acidente, nunca mais esqueceu de mais nada. Mas ao mesmo tempo em que registrava tudo o que acontecia, não conseguia pensar por conta própria, não tinha a capacidade de organizar suas ideias e interpreté-las de uma maneira mais crítica, o mesmo que acontece com a intenet e seus hipertextos.

Os textos de Paulo Serra e Antonio Hohlfeldt, “Informação e sentido” e “O projeto da Enciclopédia e seus registros sobre o Jornalismo” respectivamente, mostram a enciclopédia como uma solidificação da memória coletiva. Segundo os autores, trata-se de um grande arquivo que registra a evolução e o desenvolimento ideológicos do homem. Toda essa informação está dispersa e é curioso tentar encontrar sua base, assim como ter discernimento para distinguir a importância das coisas e tentar não deixar cair no cunho individual. Será possível? O que é importante para mim, pode não ser nem um pouco importante para você.

Isso só mostra que a tecnologia despeja informações em cima de nós o tempo inteiro e não nos dá tempo de assimilá-las, tornando o conhecimento superficial e preguiço, pois quem há de querer se aprofundar em um tema se a Wikipedia já jogou ali o que um qualquer escreveu naquela página? Clicar nos primeiro links que o Google dá como opção (quase sempre a Wikipedia está entre as três primeiras) é muito mais fácil do que ir a uma biblioteca e pesquisar em livros. E viva a a boa memória e a falta de pensamentos próprios!

sábado, 28 de novembro de 2009

Que haja luz, e Google se fez

Lucas Pacheco (06000511)

Em 1998 uma dupla de universitários procurava o que qualquer outro estudante queria (inclusive o que escreve isso aqui): uma maneira rápida, eficaz e sem esforço de saber o que realmente precisavam ler para que fossem aprovados. Frustrados com os buscadores da época, os amigos foram atrás do seu próprio algoritmo. Pouco tempo depois, com a “fórmula secreta” nas mãos, Larry Page e Sergey Brin criaram um negócio cujo tema era “obter, organizar e hierarquizar toda a informação do mundo”. Meta que na época soava ridícula, megalomaníaca e entediante para qualquer um de qualquer meio. Nascia o Google.

Dez anos depois a empresa, o negócio se tornou uma das maiores corporações do mundo, e os criadores, que nunca se formaram, são bilionários. A empresa continua com uma fórmula complexa (e trancada a sete chaves) para determinar o que é mais importante dentre tudo o que é encontrado, mas tem outra simples para “fazer dinheiro”: colocar anúncios em suas pesquisas, sem que afetem a lista de resultados. Credibilidade e lucro pra todo mundo.

Com a pretensão preguiçosa, e natural para a maioria dos estudantes, de dar respostas certas sem realmente ter que saber de tudo, Page e Brin deram um salto para o objetivo dos enciclopedistas do século XVIII: catalogar todo o conhecimento humano a partir dos princípios da razão formulados na época. Além disso, davam sustentação para a tese de Paulo Serra de que a internet seria a reposta para o problema desta construção. Pois a dupla revolucionou o modo como esse objetivo era perseguido, deixando os maçantes e tediosos tomos de lado, partindo para uma página em branco com um campo a ser preenchido.

A maioria dos problemas enfrentados pelo projeto enciclopedista foi sendo resolvida com o avanço da internet e do acesso que a população tem à ela. Antes toda vez que algo mudava na história ou na ciência, uma nova versão da Larrouse ou da Barsa tinha de ser comprada para a estante, na internet, basta editar o site. A web não tem limite de armazenamento de dados, ja os livros começam a ficar pesados com o tempo. Sempre que algo tinha de ser apreendido, você tinha de dar um pulo na estante e estudar o assunto, hoje com a popularização de gadgets como os smartphones a resposta está a poucos cliques de distância. A sociedade, reconhecendo seu novo messias, criou um novo dito “se não tem no Google, não existe.”

Mesmo assim, como apontado por Serra em “Informação e Sentido”, outras barreiras continuaram em pé. A internet passou a se comportar como Funes, o memorioso (personagem do conto de Jorge luis Borges com mesmo nome). Um homem que lembra de tudo, não consegue esquecer nada, mas que acaba confundindo passado, futuro e presente, e mostra que, com o passar do tempo sua memória se torna um “despejadouro de lixo”.

Com o aumento vertiginoso de sites, da liberdade de escrever o que quiser sobre o que quiser, da facilidade de modificação e deturpação das coisas, o algoritmo do Google (o Vasco da Gama camoniano da internet) passou a ser um Funes entupido de respostas inválidas, contraditórias e sem fontes confiáveis. Não que o Titanic fosse afundar, pelo contrario, com seu crescimento, acoplou novas áreas da informação ao seu campo de ação, de links passou às fotos, aos sons, os vídeos, notícias, mapas, geração de rotas, etc. Uma mina de outro gigantesca e aparentemente inesgotável. Assim como artistas que dão sua contribuição para a evolução da arte e depois partem para a mesmice, o Google fez sua parte e foi ganhar dinheiro. Problema de quem? Alguém que não eles.

Para felicidade geral da nação, em 2006, outro projeto que começou em 2001 tomou proporções “mundiais” e deu uma nova guinada no sonho enciclopédico. Desta vez, mostrando ligação com o movimento francês em seu nome: Wikipedia. A enciclopédia feita pelo internauta nasceu não para combater o Google, mas sim para alimentar o sucesso do buscador. Como? Se tornando a informação mais relevante que o buscador pode achar na internet. Não importa o tema, suas páginas devem conter atrativos para os parâmetros de busca do motor googleano.

O conteúdo de um texto Wiki deve conter, além da informação escrita, imagens, datas, tabelas, gráficos relativos ao tema e, principalmente, hiperlinks. A chave para o pagerank do Google. Além da ligação com as páginas-fontes do artigo, qualquer termo do texto que possa parecer um tema em si, ganha um link para outro artigo da Wikipédia (quer ele exista ou não), datas, nomes, movimentos, lugares, períodos, tudo que possa ser “substantivado” vira um link, transformando o texto em uma zebra preta e azul. Em pouco tempo, o objetivo estava cumprido, como disse a amiga Luana em Informação (s)e(m) Sentido: a Wikipedia é o 1º item da grande maioria dos resultados do Google.

Para evitar o problema do “monte de lixo” já que todos podem editar os textos da Wikipédia, o projeto passou a contratar uma equipe de revisores, padronizadores e editores. Pessoas (e não maquinas) responsáveis por checar o que está escrito, se faz sentido e se é imparcial, em caso de desaprovação o texto ganha selos avisando para a falta de fontes, de padrão, de imparcialidade ou de sentido.

Já que a Wikipédia se tornou a maior rede de hipertextos do mundo e tem uma “validação humana” de seu conteúdo, o mundo tomou formulou um novo termo o “WikiAmém”, se está em um artigo gigantesco na Wikipédia, é verdade.

O novo problema é a dependência da comunidade para a existência. E como já apontado anteriormente, o mundo tem preguiça. Como cada língua do mundo tem sua versão a Wikipédia depende da colaboração dos falantes de determinada língua para ser completa, confiável e simples.

Por exemplo, se alguns departamentos de renomadas universidades brasileiras se responsabilizassem por checarem freqüentemente os artigos dos temas nos quais são especialistas, a Wikipédia seria considerada uma fonte confiável. Mas as escolas e universidades brasileiras desestimulam e punem os alunos pelo uso da Wikipédia, pois nossa comunidade tem a fama de “desvirtuadora da internet”.

O problema do lixo pode não ter voltado, mas todos o temeram. Então, aproveitando a onda, a Microsoft e o Yahoo (publicamente aclamados Google-Loosers ou simplesmente Googloosers) pintaram como falsos profetas, prometendo a solução para aquilo que Serra, Neil Postman e Jean Baudrillard apontam: o excesso da informação muito mais atrapalha o aprendizado do que ajuda.

O Bing, novo buscador da inventora do Windows, promete não só trazer a informação relevante sobre o que busca através de uma formula matemática, mas também só te mostrar o que é necessário, chega de “desinformação”.

É verdade que infelizmente, ou não, Page, Brin e companhia limitada levaram a preguiça estudantil, e humana, a um novo patamar, o da acessibilidade: “Por que saber agora se posso googar só quando for preciso?” Também há quem esteja maravilhado com o Bing, mas continuo a pensar que é mais manipulação e pretensão te mostrar só o que alguém achou melhor do que ranquear uma pancada de links.

No fim, todos reclamam dos novos métodos de pesquisa, algo egoísta o meu ver. Acho que, se você não concorda no como uma facilidade funciona, deixe de fazer o fácil, deixe a rapidez de lado e faça o trabalho você mesmo.

Lívia Scatena – Jornalismo noturno 06000509

Eis que num belo dia surgiu a salvação dos estudantes desesperados: a Wikipedia. No ano de 2001 o site foi lançado, com objetivo de ser uma enciclopédia livre, plurilíngue e cuja colaboração na elaboração de verbetes e artigos partisse dos próprios usuários. Enfim, uma ideia moderna e visionária, perfeita para o século XXI das máquinas e computadores.

A mãe dos afoitos por informações rápidas e de fácil acesso é na verdade filha de uma grande conhecida dos que estavam na escola nos tempos pré-interneticos: a enciclopédia de capa, folhas e índice remissivo.

Na França de ideias iluministas do século XVIII, pensou-se numa forma diferente para classificar conhecimentos, tendo a razão (sempre ela) como fonte. O projeto nasceu como forma de disponibilizar as informações em sua época. É claro que nem toda informação poderia estar presente nos volumes enciclopédicos. Os editores (“homens das letras”, intelectuais) deveriam selecionar aquelas que se mostravam mais adequadas ao novo formato. Tudo o que fosse atraente e interessante deveria constar nos volumes, mesmo que tais qualidades não abrangessem aquilo que fosse mais instrutivo.

Ao enciclopedizar certos assuntos e deixando outros de fora, faz-se um recorte arbitrário daquele tempo: os editores responsáveis pelos volumes escolheriam os temas que deveriam ser rememorados pelas próximas gerações, apagando, definitivamente, tópicos que não se mostraram suficientemente interessantes para eles. Dessa forma, acabaram restringindo a memória do passado aos que a estudariam tempos depois. A escolha arbitrária daquilo que deve ser lido na posteridade é uma das críticas que Paulo Serra faz à enciclopédia em seu texto “Informação e sentido”.

É verdade que a enciclopédia nasceu com esta função seletiva (de reunir somente o essencial), mas acabou construindo uma memória coletiva eliminando outra. Ao reunir informações sobre todo e qualquer assunto disponível, gerou um gosto pelo não especializado, pelo verbete dicionarizado, cuja função é definir sem acarretar discussões.

Com o passar dos anos o conteúdo só tenderia a aumentar, claro. Tal fato acaba contrariando os objetivos da enciclopédia: se somente o relevante deve constar em suas páginas, como selecionar ainda mais os fatos lá acumulados para que caibam em 8 volumes?

Em tempos de enciclopédia virtual, tudo é muito diferente. A capacidade de memória que tem um computador pode ser imensurável, o universo on-line pode tudo armazenar, irrestritamente, imediatamente. Confia-se mais na memória da máquina que na pessoal. Tudo é esquecível, pois num clique do mouse o “tudo” pode ser rememorado e redescoberto. Toda notícia veiculada on-line é imediata. Para qualquer informação desejada, o Google dá resultados. Não há assunto para o qual não se ache respostas, ainda que não se possa confiar cegamente nelas.

Na tela inicial do site Globo.com, um dos grandes portais brasileiros, são cerca de 200 hiperlinks de assuntos diversos: Copa do Mundo, Big Brother Brasil, a novela das 21h, além de política internacional, editorias para cada grande cidade do Brasil, etc. É informação demais (muitas vezes de qualidade e veracidade extremamente duvidosas) em apenas um local.

O culto à cultura inútil e à informação descartável parece mesmo ter chegado a níveis antes impensados, tornando impossível, ainda segundo Paulo Serra, “ distinguir o memorável e o desprezível.”

Não deixa de ser verdade que existe hoje um culto também a tudo aquilo que é virtual. As pesquisas escolares feitas on-line, por exemplo, tornaram-se meras desculpas para a preguiça de enfrentar as dificuldades de consultar livros. As informações muitas vezes não se adéquam àquelas que se esperava, mas às vezes o “pesquisador” (ou fuçador virtual) não consegue identificar erros ou discordâncias, justamente por não estar acostumado a “discutir” com o texto que acaba sendo apenas um mero definidor de verbetes.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Ainda temos opções

O meu trabalho de conclusão de curso (TCC) é sobre um vilarejo do interior de Minas Gerais, chamado Lapinha da Serra. Como o acesso é ruim e a estrada só abriu a cerca de dez anos atrás o vilarejo ainda possui características de um lugar que parou no tempo. A única maneira dos lapinhenses saberem o que está ocorrendo fora da Lapinha é através dos turistas ou da televisão. O rádio que não funciona muito bem, na maioria das vezes só serve para tocar música sertaneja. O povoado possui um único orelhão, que dificilmente funciona. A internet está longe de ser instalada. O jornal também não chega tampouco revistas.

As notícias que realmente interessam ao vilarejo são contadas na praça. Para se atualizar basta ir a uma das rodinhas de conversa e bater uma prosa. As “notícias” nem sempre são confiáveis, mas raramente são mal contadas. Apenas os mais novos que saem do vilarejo pra estudar na pequena cidade vizinha, ficam sabendo o que ocorre no resto do mundo sem ser pela televisão.

Os lapinhenses adquirem informação de maneira muito mais coletiva que a gente que vive em São Paulo. Essa maneira de adquirir informações individualmente também prejudicou a convivência com nossos vizinhos, que dificilmente avistamos e raramente nos comunicamos. Enquanto eles procuram a informação do dia, a gente procura a informação do minuto. Eles não selecionam a informação. Nós selecionamos tudo que lemos, pois seria impossível ler tudo que é produzido.

O maior efeito da banalização da informação talvez nem seja nossa incapacidade de selecioná-las corretamente, devido a sua quantidade infinita, mas sim sua perda de valor. No ano em que estourou o “mensalão”, a maioria dos meios de comunicação criticava o governo Lula, se falou até em impeachment, mas sua popularidade e aceitação só aumentaram.

Na Lapinha a banalização da noticia não ocorre, o que é noticiado pela manhã todos ainda se recordam a noite, isso não acontece em São Paulo. Quem lê uma notícia ao ir para o trabalho de manhã, fatalmente não vai lembrar-se do que leu ao anoitecer. Nossa memória é contrária a de Funes, no conto “Funes, o Memorioso”, de Jorge Luís Borges. Funes é dotado de uma memória infinita e nós se tratando de notícias, uma memória finita, a cada dia. Porém a memória de Funes pode ser comparada com a internet como bem percebeu Paulo Serra em seu texto “Informação e Sentido” que ainda usa outros textos de Borges para exemplificar suas teorias. Segundo Paulo Serra, quanto mais informação existe menos sentido observaremos, ou seja, a banalização da informação faz com que a mesma perca seu valor.

Obviamente fiz generalizações tanto sobre os moradores de São Paulo como os moradores da Lapinha, mas serviram em um único sentido para demonstrar o nosso passado e o nosso presente. Cabe a cada indivíduo de cada lugar decidir em que tempo viver, ou melhor, se sua memória vai ser um despejadouro de lixo ou um vertedouro de matéria prima. Mesmo vivendo em São Paulo há meios de selecionar bem o que se lê ou o que se vê, o problema é organização e vontade pra fazer isso diariamente. Porém para nós, ainda há essa possibilidade.

Todo o poder aos receptores!


Por oito votos a um, o STF derrubou no dia 16 de junho a obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão de jornalista. A decisão trouxe mais calor a uma discussão que já fervia desde a consolidação da internet como fonte de informação. De um lado, a defesa do jornalismo responsável, feito profissionais e difundido por veículos tidos como ‘de confiança’; do outro, a poderosa ascensão dos blogs e microblogs - páginas de conteúdo livre, cujos autores podem ser de leigos a especialistas. A raiz do debate, assim como a base da argumentação dos ministros favoráveis a essa decisão, tem alicerce na liberdade de expressão e informação, garantida pela Constituição Federal. No mesmo embate entram as críticas negativas e elogios feitos às enciclopédias online livres e colaborativas.Tudo isto porque a internet revolucionou os métodos de busca por conteúdo e abalou as estruturas da Teoria da Comunicação aplicada à veiculação de informações.

Já estiveram muito bem definidos os papéis de emissor e receptor dentro desse sistema. Jornais impressos, revistas, programas de rádio, telejornais, enciclopédias, dicionários, livros didáticos, entre outros, sempre cumpriram a função de informar leitores, ouvintes e telespectadores que limitavam-se à condição de meros receptores.

Os blogs surgiram nos anos noventa como uma espécie de relato de links interessantes. A febre pegou de vez em 2001 e, aos poucos, os receptores perceberam nessa ferramenta a possibilidade de expressar opiniões, informar o que os jornais não informam, iniciar debates, divulgar trabalhos sociais, criar conteúdos, enfim, experimentaram de um poder antes restrito aos emissores. Não deixaram de receber informações das fontes habituais, mas ganharam voz para confrontar, reforçar, distorcer, divulgar...

Outra séria ameaça ao domínio dos emissores nasceu com o advento das enciclopédias online colaborativas. A liberdade proposta pela Wikipédia, por exemplo, causa arrepios nos dependentes de fontes ‘oficiais’: “qualquer pessoa com o acesso à Internet pode modificar qualquer artigo, e cada leitor é potencial colaborador do projeto”. Ou seja, aqui cai por terra distinção habitual entre emissores e receptores. Tem-se a possibilidade de escolher que papel assumir.

A inevitável pulverização de fontes decorrente deste processo contempla a liberdade de expressão ao mesmo tempo em que expõe três questões cruciais, daquelas capazes de alimentar debates infinitos no âmbito jornalístico. A primeira trata da possibilidade de dar voz aos pequenos e minimizar o monopólio da grande mídia sobre a veiculação de informações; a segunda é sobre a credibilidade de fontes alternativas; e a terceira questiona se há real ganho intelectual com a ampliação do acesso a informações.

Particularmente, desconfio quando dizem que vivemos um momento de democracia digital. Poderíamos chegar lá, não duvido do potencial da internet. Mas, em uma era de domínio dos sites de busca, onde “jogar no Google” virou sinônimo de “pesquisar na web”, nem todas as fontes ganham o destaque necessário para que se considere uma real tendência à pluralização de vozes. Sites com maior audiência são priorizados. Critérios pouco conhecidos pelo grande público são adotados na hierarquização dos resultados em sites de pesquisa.

O culto às chamadas fontes oficiais coloca em questão a credibilidade de páginas menos visitadas, menos conhecidas. É certo que depositar total confiança no conteúdo da web expõe o internauta à possibilidade de crer em informações incorretas. Mas esta não é uma particularidade da internet, qualquer veículo pode oferecer tal risco, se não for adotada uma postura devidamente crítica diante do que é informado.

O problema da web é que ela atende com eficiência a uma demanda crescente por informações de rápido consumo. A necessidade de atualizações rápidas culmina na produção de conteúdos razos, porém com profundidade suficiente para satisfazer leitores apressados. Dessa relação de cumplicidade entre emissores cobrados por alta produção e receptores ávidos por novidades quentes, nascem fontes metralhadoras de conteúdo. Um turbilhão de informações é diariamente despejado sobre um público que ainda não encontrou uma forma de assimilar tal quantidade.

Escrito por Paulo Serra, o artigo “Informação e Sentido” aponta para essa questão e mostra que o internauta sente dificuldade em selecionar e incorporar o que de fato é relevante, o que, paradoxalmente, gera uma legião de alienados pelo excesso de informação, cegos pelo excesso de luz.

Considerando-se a grandeza e bipolaridade do potencial da internet, faz-se necessária uma reeducação dos receptores. A busca pelo uso benéfico da rede não pode se encerrar na crença de que o excesso de luz cega e, portanto, não há o que fazer. O ser humano é capaz de enxergar até no escuro, se necessário. É preciso um esforço coletivo para adaptar os olhos à dinâmica virtual.

Sem tempo para o aprofundamento

- Estagiário, faça uma nota, por favor, sobre a visita do premier de Israel no Brasil para publicar o quanto antes no site.

Ele imaginou a estrutura de seu texto: falaria primeiro sobre o motivo do político no país, depois sobre como a questão das discussões é tratada em sua nação de origem, o que incluiria um pequeno contexto histórico, passaria para a discrição do encontro entre as autoridades, depois para a relação entre os dois países, mais uma vez com retrospectiva histórica, para, enfim, tratar das conclusões e acertos que chegaram as negociações.

Tinha material para um livro-reportagem. Mas seu espaço, assim como o tempo, era restrito. Portanto, a primeira ideia de agrupar diversos contextos e aprofundar a questão foi logo substituída por uma rápida pesquisa na internet e a famosa "cozinhada" de textos já publicados. O resultado foram parágrafos curtos e links que levavam palavras-chaves a textos maiores, entrevistas longas ou vídeos. Resumidamente, o que foi produzido foi um texto rápido e superficial, assim como, provavelmente, os textos usados para a pesquisa.

Estes últimos são denominados "hipertextos", estruturas difundidas com o advento da internet e publicados em sites como a Wikipedia. Os autores são desconhecidos e, ao mesmo tempo, podem ser qualquer um, não mais especialistas e estudiosos. A pesquisa para produzi-los não exige nenhum grande aprofundamento. O conteúdo deriva das enciclopédias, o que faz com que o trabalho de campo e apuração de informação entre em extinção. Assim, a facilidade de publicação e veiculação de informação se torna um aspecto prejudicial na relação do leitor com o conteúdo e o impacto que esse exerce sobre as comunidades, como revela Olga Pombo, em Enciclopédia e Hipertexto. O Projecto: "essa condição ilimitada do hipertexto tem como efeito a desorientação, a sobrecarga, a banalização e a indiferenciação dos conteúdos veiculados".

A condição ilimitada descrita pela autora é o que sujeita os leitores a um bombardeio de informações (e imagens), que por sua vez estimulam um olhar vicioso sobre os conteúdos, esvaziados de reflexão. A disseminação do conteúdo humano, através deste tipo de texto, ficou instantânea (a qualquer hora é só consultar a Wikipedia ou dar um Google) e, num primeiro momento deixando de lado a questão do acesso à internet, mais participativa, já que o conhecimento pode ser modificado e atualizado por quem se voluntariar para tal. Por outro lado, para os leitores armazenarem este conteúdo e, mais do que isso, o conteúdo correto, o desafio é grande. Além de a internet oferecer centenas de verbetes/links sobre um mesmo assunto, muitos deles não são tão inteligíveis ou não têm a credibilidade de um texto produzido para uma enciclopédia, por exemplo.

Para apurar e elaborar o conteúdo das enciclopédias, ao contrário, era necessário um grande tempo de pesquisa de campo (o primeiro exemplar demorou 25 anos para ficar pronto) e envolvimento do autor com o tema, como mostra Antonio Hohfeldt em O Projeto da Enciclopédia e seus registros sobre o Jornalismo. O conhecimento estava lá pronto para ser lido e, uma vez impressa, a Enciclopédia não permitia modificações. Concentrava o conhecimento dos estudos e teorias que a ciência tinha acumulado ao longo dos anos. E apesar de apresentarem uma diferença significativa, os dois tipos de texto são ferramentas que utilizamos para organizar nosso conhecimento e um não substitui o outro. O hipertexto é o avanço da enciclopédia, que já trabalhava, por exemplo, com verbetes que poderiam remeter a outros. Os links do hipertexto são a mesma ideia, mais rápida e modernizada.

O papel da Internet no desafio de organizar o conhecimento

Alexandre Napoli (06004502)

As formas de organizar o conhecimento são episodicamente contestadas e suplantadas ao longo dos séculos. Na esteira dos ideais iluministas, surgiu o projeto que se firmou como hegemônico até a atualidade: a Encyclopédie ou Enciclopédia Francesa, de Jean le Rond d'Alembert e Denis Diderot. Inovadora tanto em sua concepção do conhecimento humano quanto no formato, a Encyclopédie representa um marco na evolução das formas de organização do saber. Ao identificar o conhecimento tradicional como uma forma de saber fundamentada em superstições e preconceitos, seus idealizadores apostavam na razão como único meio para se chegar à verdade, rompendo com a versão católica da revelação como base da ciência. Epistemologicamente, alicerçava-se no empirismo de John Locke e Francis Bacon e, como colaboradores, contou com ícones do pensamento iluminista francês, como Voltaire, Rousseau, e Montesquieu.

Tanto ou mais revolucionário que suas bases teóricas era seu formato. Rejeitando o único método de organização de obras do tipo - o método enciclopédico, que arranjava o conteúdo por temas, - a Encyclopédie de d’Alembert e Diderot adotou o método do dicionário, organizando os artigos por ordem alfabética. Em cada tópico, acrescentava-se, em parêntesis, o campo de conhecimento ao qual ele pertencia, e um novo recurso, reconhecido como o mais inovador da Enciclopédia, denominado referência cruzada, representava um avanço enorme em relação aos modelos enciclopédicos anteriores. A referência cruzada é um artifício através do qual um tópico da Enciclopédia remete a outro tópico relacionado a um mesmo tema. Transplantando para a atualidade, o conceito pode ser comparado a um link de uma enciclopédia virtual de modelo wiki. Este recurso abre uma perspectiva imensa e alça a pesquisa a um potencial virtualmente infinito.


Apesar de sofrer certo abalo depois do fracasso do projeto enciclopédico positivista, e, em função disso, cair em descrédito durante certo período do século XX – notoriamente, entre as décadas de 1940 e 1960, quando, sobretudo na literatura, destacam-se autores como Alberto Savino, Georges Perec, Ítalo Calvino e Jorge Luís Borges, que questionam e criticam a obsessão racionalista do modelo enciclopédico –, este modelo concebido por d’Alembert e Diderot atravessou incólume grande parte do século XX. De fato, nem as significativas mudanças às quais ele esteve confrontado durante a década de 1970 - data do surgimento de enciclopédias de concepção inovadora, que rejeitavam a perspectiva positivista e a organização alfabética dos temas, como a Britannica, a partir da 15º edição (1973-1974), a Universalis (1968-1975) ou a Einaudi (1977-1984), – foi capaz de modificar profundamente sua estrutura. Ao mesmo tempo, nenhum outro modelo à altura surgiu para rivalizar ou roubar-lhe o lugar.


No entanto, algumas falhas e limitações graves do modelo de d’Alembert e Diderot faziam ansiar por novas formas de organização do conhecimento ou, ao menos, por técnicas e procedimentos que o aprimorassem. Em seu texto Informação e Sentido – Notas para uma abordagem problemática do conceito de informação, Paulo Serra situa com clareza três dos mais sérios problemas do modelo da Encyclopédie. O primeiro, segundo ele, refere-se à constante necessidade de atualização. Uma necessidade que uma enciclopédia como essa não pode suprir, porque faltam-lhe meios mais ágeis para fazê-lo. Considerando o tempo que um projeto como a Encyclopédie demora a ser finalizado (a publicação de seus 17 volumes de texto e 11 de gravuras durou cerca de 22 anos), é de se esperar que, no momento em que chega às lojas, suas informações já estejam ultrapassadas. Por outro lado, ao tentar remediar essa situação com atualizações permanentes, o conteúdo da enciclopédia alargará cada vez mais, chocando-se com um dos preceitos básicos do projeto, o de oferecer uma carga de conhecimento relevante e atual de maneira resumida.


O segundo problema apresentado pelo autor refere-se ao critério segundo o qual um “princípio de organização sistemática” é adotado. Que argumento orienta e legitima a escolha de um princípio, em detrimento de outro? Serra defende que, já que partimos de uma infinidade de princípios possíveis, e escolhemos apenas um, nossa escolha só pode ser entendida como arbitrária. O terceiro problema diz respeito ao tipo de informação que merece ser divulgada. Com quais critérios classificamos uma informação como relevante, e outra como supérflua? Ou melhor: como podemos distinguir uma da outra? Como separar uma informação científica, comprovada racionalmente, de uma informação cujo apelo reside exclusivamente em seu caráter curioso, espetaculoso, descartável?

Aparentemente, a solução para esses três impasses reside na nova linguagem cibernética fundamentada no hipertexto. Quanto ao primeiro problema, o da necessidade de atualização, a Internet o resolve facilmente, por ser um tipo de mídia cuja atualização se dá de forma permanente e instantânea, eliminando, nas palavras de Serra, “o tempo de intervalo entre a produção (publicação) e a recolha (consulta) da informação”. Quanto ao segundo problema, a questão do critério que norteia a escolha de um determinado princípio de organização, a Internet o supera por possibilitar o emprego de um número ilimitado deles, devido à capacidade quase infinita de sua “estrutura hipertextual”, e aos vários sistemas de pesquisa disponíveis. O terceiro e último problema - referente ao critério que orienta a classificação de uma informação como importante ou inútil -, torna-se também suplantado, pois a rede, por meio de sua infinita capacidade de armazenamento, pode reunir qualquer tipo de informação, não apenas as consideradas importantes ou relevantes. Na Internet, a preocupação com o espaço desaparece, e a preocupação com o tempo diminui sensivelmente.

No entanto, apesar do desenfreado otimismo que a mídia cibernética suscita, ela peca justamente pela característica lhe dá mais brilho: o excesso. Como demonstra o autor, a superexposição de informações acaba por suprimir-lhe o sentido. Com informações tão variadas e abundantes na rede, torna-se praticamente impossível separar o joio do trigo, a informação relevante do lixo informativo. Se, a princípio, a Internet parece realizar o projeto enciclopedista da criação de uma memória artificial sobre-humana, ela esbarra na impossibilidade da seleção, do filtro, do crivo que discrimina a informação importante da informação irrelevante. Se nos lembrarmos de tudo ao mesmo tempo, não teremos a capacidade de hierarquizar as questões mais caras ao conhecimento humano. Nesse sentido, Serra expõe o paradoxo de que somente a memória humana – falha, limitada, frágil – e não a memória das “tecnologias da informação”, é capaz de imprimir sentido à informação.

O autor ressalta que a possibilidade de seleção da informação é possível se o cibernauta possuir o mínimo de instrução, e tenha o “mapa do território” da informação que deseja buscar. Caso o usuário da rede não possua este mapa, “resta-lhe navegar às cegas, saltitando de site para site, de informação para informação, até deparar com a informação mais fácil, ou a mais atrativa, ou mesmo a mais chocante”. Para ilustrar o argumento, Serra cita o paradoxo desenvolvido por Platão, de que “a informação (importante) só tem utilidade para quem está informado (e conhece); a quem não está informado (nem conhece), de nada serve procurar essa informação”.

O texto problematiza as fragilidades do projeto enciclopédico com admirável poder de síntese. Ao equacionar as limitações do modelo da Encyclopédie, e dividi-las em três problemas principais, Serra nos mostra com bastante precisão o que impede a realização do sonho dos que se ocuparam, até agora, da tarefa colossal de organizar o conhecimento humano. Também é bastante rica a análise de como a Internet poderia superar os obstáculos físicos e temporais, inerentes ao projeto enciclopédico de d’Alembert e Diderot. Não obstante, a revelação do texto está no reconhecimento de que o espaço cibernético não representa a cura de todos os males, mas pelo contrário, acirra ainda mais os paradoxos entre informação e conhecimento. Este diagnóstico desmistifica com contundência o mito da informação, de que “as maquinas da memória” realizarão o sonho moderno de “registrar, conservar e transmitir todas as memórias – garantindo assim a abundância de sentido”. Segundo Serra, a incapacidade da Internet em filtrar o conteúdo informativo faz desta qualidade de armazenamento um peso morto, já que da nada adianta reunir todo tipo de informação se não é possível selecioná-la ou classificá-la.

Um ponto fraco do texto refere-se à crença excessiva de que o usuário da Internet é um inapto por excelência; como se o cibernauta fosse incapaz de distinguir qualquer tipo de informação, e precisasse o tempo todo de um guia didático que o acompanhasse através dos sites. Essa depreciação do cibernauta revela uma fé ingênua de que só é possível buscar informação e adquirir conhecimento através dos modelos tradicionais de organização do saber; como se ato de entrar em contato com o conhecimento fosse uma ação puramente passiva, não exigindo nenhum empenho do leitor.

Outra lacuna do texto é a ausência do debate sobre a falta de credibilidade da informação veiculada nas redes. À medida que a Internet democratizou o acesso à produção de conhecimento, ela também o banalizou. Hoje qualquer um pode escrever na rede e alçar a informação a um status de informação científica, bem apurada e definitiva. A proliferação das enciclopédias de modelo wiki convidam o leigo, ou não especialista, a contribuir com informações. È claro que ela tem um mecanismo interno que atesta sua validez, mas sempre estará no ar a dúvida de que a informação possa ter sido redigida por um usuário qualquer, desprovido de rigor algum. Tanto ou mais importante do que a discussão proposta pelo autor, de que a abundância de informações satura a Internet e esvazia o sentido da informação, a falta de credibilidade é talvez o mais forte obstáculo à substituição definitiva do modelo enciclopédico de d’Alembert e Diderot por seu equivalente digital.

Aparentes Paradoxos

Victor Ribeiro (05008271)
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"Com efeito, a finalidade de uma Enciclopédia é reunir os conhecimentos dispersos pela superfície da terra, expor o seu sistema geral aos homens com quem vivemos, e transmiti-lo aos homens que virão depois de nós; a fim de que os trabalhos dos séculos passados não tenham sido trabalhos inúteis para os séculos que se sucederão; que os nossos descendentes, tornando-se mais instruídos, se tornem ao mesmo tempo mais virtuosos e mais felizes, e que nós não morramos sem termos desmerecido do gênero humano."
Denis Diderot

Se o filósofo francês Denis Diderot estivesse vivo, com certeza estaria realizado. A citação acima, utilizada por Paulo Serra em "Informação e Sentido", atualmente, não poderia mais ser vista como um desafio, mas uma realidade. O advento do hipertexto possibilitou a eterna “memorização” dos acontecimentos, mas também trouxe à tona uma nova discussão: o excesso de informação produz um efeito regulador ou emancipador no homem pós-moderno?

É muito fácil notar as mudanças geradas em nossa sociedade diante das constantes evoluções tecnológicas. Talvez as maiores conseqüências de tantos avanços sejam o encurtamento das distâncias, do tempo e a aceleração de todas atividades de um mundo globalizado.

Simultaneidade. Fluxos velozes. Aceleração. Volatilidade. Efemeridade. Dinamismo. Essas e outras características que, de certa forma, caracterizam a atual sociedade, podem ser claramente vistas nas páginas da Internet. O hipertexto, afirma Olga Pombo, se constitui como um “espaço múltiplo, da deriva, da não-linearidade, da conectividade, intertextualidade, transtextualidade, da indeterminação dos limites ou da infinita abertura do texto”.

Enquanto dimensão chave da Internet - isto é, dispositivo que permite conectar em redes as informações disponíveis em todos os servidores do mundo -, o hipertexto se ofereceria como a potenciação última da idéia de enciclopédia, com as vantagens de ser facilmente atualizada, possuir conteúdo mais extenso, centralizado e acessível.

Por outro lado, Pombo chama a atenção para alguns problemas ocasionados pelo excesso de liberdade nas páginas da web, como a questão da seletividade. “Esta condição não seletiva da internet arrasta consigo problemas de credibilidade, legitimação, erro, engano, contra-informação (individual e institucional). É certo que, no hipertexto, há mecanismos de filtragem, de organização, de indexação. Num centro sentido, os motores de busca oferecem esboços de seleção. Trata-se, porém, de uma seletividade a posteriori que só funciona na medida em que o leitor é detentor de competências críticas de discriminação do que é importante, de dispositivos subjetivos de determinação das boas e das más informações. E, sem essas competências, sem essa arte de filtrar que ninguém sabe como se adquire e como se ensina, são inevitáveis a banalização e a indiferenciação”.

Se o processo enciclopédico de Isidoro de Sevilha ou Diderot representava a institucionalização dos dados organizados a partir de uma única visão e, de certa forma, inquestionável , o hipertexto funciona de forma inversa. Em páginas como Wikipédia, cujo slogan é “a enciclopédia livre”, qualquer um pode alterar o conteúdo dos verbetes. Se por um lado isso democratiza a informação, por outro gera a dúvida do que é ou não confiável.

No jornalismo, o assunto também é polêmico. Com a velocidade cada vez maior do fluxo de informações, a tendência é que a falta de tempo para pesquisas continue aumentando e o leitor, cada vez mais, passe a conhecer o desenrolar dos acontecimentos junto com o próprio jornalista. É muito comum que websites, na pressa de informar, publiquem notícias incompletas, que vão se atualizando a cada minuto. É uma lógica paradoxal: como a novidade pode ser o maior problema de quem se compromete a trazê-la a cada minuto?

O resultado mais provável é a manutenção do senso comum. A falta de notícias gera notícia. Qualquer coisa se torna notícia. Herbert Gans, sociólogo americano, afirmou em seu livro “Democracy and the News” “O caráter de novidade procura conferir ineditismo a situações corriqueiras, o que, no limite, acaba por constituir uma fraude, quando poderia expressar-se efetivamente através de um enfoque crítico dessas mesmas situações”.

E é exatamente o enfoque crítico que se tornou alvo de discussão para Paulo Serra. Ao contrário do que possa parecer à primeira vista, o excesso de conhecimento e informação pode gerar “perda de sentido”. É mais ou menos como o antigo argumento de que luz em excesso, ao invés de iluminar, pode cegar.

Neil Postman e Jean Baudrillard afirmam que, atualmente, estamos expostos a tantas informações e de maneira tão próxima e imediata que o conhecimento e a capacidade de análise de cada um estão dando lugar a uma “memória artificial”. A partir deste processo, teríamos cada vez mais dificuldades para selecionar, compreender e criticar as informações que buscamos. Nos manteríamos sempre no senso comum e nossa memória seria “depósito de lixo”.

No conto “Funes, o memorioso”, do escritor argentino Jorge Luís Borges, é possível perceber perfeitamente os efeitos que este conflito entre ter a informação e compreendê-la pode ocasionar. O autor apresenta a história de Ireneo Funes, dono da maior memória do mundo, que consegue guardar qualquer informação. Entretanto, não sabe selecionar, hierarquizar ou definir o que é importante para ser lembrado e o que não.
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“A memória é tão essencial à construção (e definição) da subjetividade, de identidade individual, como à interpretação, à atribuição de sentido”.
Henri Bérgson

A internet tem essa capacidade bipolar de emancipar e regular. De oferecer todas as ferramentas para um possível crescimento intelectual e ao mesmo tempo diminuir o poder de seleção e interpretação de cada um. Porém, me parece um absurdo culpar um mero instrumento de comunicação e pesquisa pela falta de interesse das pessoas. Se trata muito mais de um problema educacional do que tecnológico. Se possuímos a capacidade de discutirmos este assunto, temos também a possibilidade de encontramos soluções para aparentes paradoxos.