quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Para o bem ou para mal

Hoje fala-se muito sobre a definição dos blogs, se eles precisam ser mesmo opinativos, se devem ser em primeira pessoa, se devem aceitar patrocínios e anunciantes, etc. Num nível mais elevado fala-se também de como o jornalismo dito mainstream perdeu hoje algumas de suas características básica, que remontam ao período iluminista: levar conhecimento para que os indivíduos possam formar suas próprias opiniões e senso critico, para não ficarem presos ao senso comum. Conceito derivado daquele de Enciclopédia (educação completa) que surge com o objetivo de registrar uma memória de diversos períodos da história.

Seguindo rumos similares aos dos autores Olga Pombo, Paulo Serra e Antonio Hohlfeldt, que discutem a noção de que a internet é a potenciação do projeto de Enciclpédia, Sylvia Moretzsohn em sue livro "Pensando Contra os Fatos", levanta vários fatores que contribuíram para esse desvirtuamento do fazer jornalismo.

A questão da busca pela objetividade absoluta – que retira quase todo o caráter humano do jornalismo, ou seja a subjetividade -, a idéia de que os fatos falam por si só, a urgência pelo furo e pela velocidade absurda das rotinas e até a forma industrial que passou a reger a produção jornalísticas, que submetidas às lógicas de fragmentação da sociedade de consumo, acabam ofuscando a visão (entendimento) do leitor não pela escassez, mas pelo excesso de informações que passavam a adotar características de efemeridade e rápido esquecimento.

Some-se a isso as várias formas de controle, sempre com algum comprometimento político ou comercial. Assim, como afirmado por Serra, trata-se não só de modificações na natureza da mídia, mas também na sua cada vez mais constante submissão a diferentes lógicas mercadológicas.

É nesse cenário que os blogs começam a ganhar relevância, exercendo aquela função de um “quinto poder”. Sobre o assunto Ramonet diz: “Um “quinto poder” cuja função seria denunciar o superpoder da mídia, dos grandes grupos midiáticos, cúmplices e difusores da globalização liberal”. Assim, os blogs – mas vale ressaltar que apenas aqueles que se dedicam a tal atividade com a devida consistência e comprometimento, e verdadeira liberdade de expressão – surgem com essa função fiscalizadora, meio como observatório da imprensa.

Outra característica é o suprimento das insuficiência dos veículos mais tradicionais. A falta de tempo e espaço para maiores reflexões ou uma análise mais contextualizadora dos fatos, acaba encontrando uma certa solução nos blogs. Num veículo onde a subjetividade, logo a opinião e interpretação, é o que mais se procura, é o espaço onde o jornalismo pode se aliar a subjetividade sem medo algum. A objetividade que busca tirar o caráter humano do fazer jornalismo é aqui colocada em segundo plano. O que importa é a opinião, a interpretação, análise e reflexão, trazendo um pouco do senso crítico perdido, de volta a pauta.

Assim como no citado "Funes, o memoriso", de Jorge Luis Borges, onde as lembranças se acumulam, se confundem, podendo levar à perda sentido, a internet acaba passando por processos similares. De separa aquilo que é realmente relevante, do que é mais uma reinteração do senso comum.

Obviamente nem tudo na blogosfera merece destaque. Enquanto existe blogs que se prezam a realmente explorarem assuntos, temas e reflexões que dificilmente encontram espaço na grande mídia, outros não são nada além de um varal de releases. Ou então, utilizam o blog como uma vontade de ser mainstream, quase como um porftólio de ingressão no mercado de comunicação - o que no fim acaba sendo uma reiteração de tudo aquilo que os veículos tradicionais já fazem.

Não é à toa que os blogs mais respeitados e que fazem mais sucesso são aqueles que apresentam uma forte consistência de idéias e opiniões. São aqueles onde o senso critico de quem o escreve permite aquele exercício de suspensão do cotidiano. Sylvia Moretzsohn diz no seu livro: “a condição para tornar-se uma referência no meio virtual ou para influenciar o rumo do noticiário não viria, como deveria ser óbvio, do conhecimento de que os seus autores gozam por razões exteriores à blogosfera, como políticos, comentadores, colunistas, etc, mas da competência e do empenho do indivíduos.”

Isso sem contar na participação mais ativa do leitor, uma da características fundamentais do blog e que mantém estreita relação com nossa sociedade pós-moderna. O que segundo os autores analisados, indica uma possível superação da enciclopédia pela internet, devido a sua flexibilidade, possibilidade de atualização rápida e intertextualidade.

Hoje o leitor não quer mais se sentir passivo, mero receptor de informação. Ele quer também poder emitir sua opinião, dúvida, questionar e discutir determinado tema ou fato. E isso se torna cada vez mais possível no blogs e sistemas como wikiepedia, ainda que carecendo de uma melhor utilização.

Diferente daquele conceito de jornalismo participativo ou jornalismo cidadão, em que qualquer um pode ser considerado jornalista e divulgar informações sem critério algum, os comentários dos blogs se apresentam muito mais como uma vontade de discussão e necessidade de troca, do que vontade de ser jornalista. Hoje aquela posição de superioridade do jornalista, começa a incomodar um número crescente de leitores, fazendo cada vez mais presente um desejo maior por proximidade.

Proximidade essa que se dá constantemente nos blogs. Através dos comentário, é possível gerar discussões e trocas de informações e interpretações que hoje se mostram tão necessárias diante de um mídia tradicional toda engessada por questões políticas e comerciais. Conceito similar a contextualização citada pelos três autores analisados.

Por isso é tao importante que blogs se mostrem reticentes ou até mesmo contra algumas formas de patrocínios ou de publicidade em seus espaços. Hoje o que torna os blogs algo tão importante é justamente essa liberdade e espontaneidade.

Assim, ao invés de enxergar os blogs e outras formas similares de jornalismo na internet como uma ameaça ao dito jornalismo tradicional, é muito mais adequado enxergar esses fenômenos como complementares. Os jornais e revistas não vão deixar de existir, nem de exercer seu papel na divulgação de informação. Mas se neles não há espaço para essas trocas tão fundamentais para o conhecimento e esclarecimento, que os blogs possam continuar exercendo esse papel cada vez melhor e para um público cada vez maior.

Por Luigi Torre

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