sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Sem tempo para o aprofundamento

- Estagiário, faça uma nota, por favor, sobre a visita do premier de Israel no Brasil para publicar o quanto antes no site.

Ele imaginou a estrutura de seu texto: falaria primeiro sobre o motivo do político no país, depois sobre como a questão das discussões é tratada em sua nação de origem, o que incluiria um pequeno contexto histórico, passaria para a discrição do encontro entre as autoridades, depois para a relação entre os dois países, mais uma vez com retrospectiva histórica, para, enfim, tratar das conclusões e acertos que chegaram as negociações.

Tinha material para um livro-reportagem. Mas seu espaço, assim como o tempo, era restrito. Portanto, a primeira ideia de agrupar diversos contextos e aprofundar a questão foi logo substituída por uma rápida pesquisa na internet e a famosa "cozinhada" de textos já publicados. O resultado foram parágrafos curtos e links que levavam palavras-chaves a textos maiores, entrevistas longas ou vídeos. Resumidamente, o que foi produzido foi um texto rápido e superficial, assim como, provavelmente, os textos usados para a pesquisa.

Estes últimos são denominados "hipertextos", estruturas difundidas com o advento da internet e publicados em sites como a Wikipedia. Os autores são desconhecidos e, ao mesmo tempo, podem ser qualquer um, não mais especialistas e estudiosos. A pesquisa para produzi-los não exige nenhum grande aprofundamento. O conteúdo deriva das enciclopédias, o que faz com que o trabalho de campo e apuração de informação entre em extinção. Assim, a facilidade de publicação e veiculação de informação se torna um aspecto prejudicial na relação do leitor com o conteúdo e o impacto que esse exerce sobre as comunidades, como revela Olga Pombo, em Enciclopédia e Hipertexto. O Projecto: "essa condição ilimitada do hipertexto tem como efeito a desorientação, a sobrecarga, a banalização e a indiferenciação dos conteúdos veiculados".

A condição ilimitada descrita pela autora é o que sujeita os leitores a um bombardeio de informações (e imagens), que por sua vez estimulam um olhar vicioso sobre os conteúdos, esvaziados de reflexão. A disseminação do conteúdo humano, através deste tipo de texto, ficou instantânea (a qualquer hora é só consultar a Wikipedia ou dar um Google) e, num primeiro momento deixando de lado a questão do acesso à internet, mais participativa, já que o conhecimento pode ser modificado e atualizado por quem se voluntariar para tal. Por outro lado, para os leitores armazenarem este conteúdo e, mais do que isso, o conteúdo correto, o desafio é grande. Além de a internet oferecer centenas de verbetes/links sobre um mesmo assunto, muitos deles não são tão inteligíveis ou não têm a credibilidade de um texto produzido para uma enciclopédia, por exemplo.

Para apurar e elaborar o conteúdo das enciclopédias, ao contrário, era necessário um grande tempo de pesquisa de campo (o primeiro exemplar demorou 25 anos para ficar pronto) e envolvimento do autor com o tema, como mostra Antonio Hohfeldt em O Projeto da Enciclopédia e seus registros sobre o Jornalismo. O conhecimento estava lá pronto para ser lido e, uma vez impressa, a Enciclopédia não permitia modificações. Concentrava o conhecimento dos estudos e teorias que a ciência tinha acumulado ao longo dos anos. E apesar de apresentarem uma diferença significativa, os dois tipos de texto são ferramentas que utilizamos para organizar nosso conhecimento e um não substitui o outro. O hipertexto é o avanço da enciclopédia, que já trabalhava, por exemplo, com verbetes que poderiam remeter a outros. Os links do hipertexto são a mesma ideia, mais rápida e modernizada.

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