domingo, 22 de novembro de 2009

A Impotência diante dos fatos

Bruno de Pierro - 06008087



Enquanto a prática jornalística continuar a se apresentar como forma de elevação acima da vida cotidiana, insistindo na ingênua crença de que sua objetivação deva ser fundamentada segundo modelos de observação, narrativa e circulação de informação caducos e pseudocientíficos, continuaremos a vislumbrar um outro jornalismo. Diferente do artista e do cientista, cujos esforços para se manterem suspensos de suas próprias particularidades, ao menos durante o momento de produção, é uma constante, o jornalista não deveria dar-se por satisfeito quando precisamente “abstrai” de seu processo de criação as atividades cotidianas. Ou, então, quando se posta na função de promover a organização do real, hierarquizando os elementos do espaço tendo em vista o fim último – explicar algum fato por meio da execução de uma técnica dita jornalística.

A forma como esta técnica vem sendo praticada atualmente, nos principais meios de produção da informação, está de acordo com modelos de pensamentos que ainda sobrevivem com vigor, e que viciam o olhar do jornalista ainda em sua formação, impondo-lhe certas advertências (restrições) que o acompanharão ao longo deste processo. Pois é esta técnica que insiste em colocar-se em posição elevada com relação à cotidianidade, voltando-se, para isso, a somente o que diz respeito às atividades “humano-genéricas”, como diria Agnes Heller. As questões “superiores”, que a todos pertencem, genéricas, são, de fato, aquelas em que a moralidade e as idéias ganham evidência. Entretanto, é preciso saber que particularidade e genericidade formam a heterogeneidade da vida cotidiana, sendo que os choques entre elas “não costumam tornar-se conscientes na vida cotidiana; ambas submetem-se sucessivamente uma à outra do aludido modo, ou seja, ‘mudamente”. Com isso, continua Heller, “aumentam as possibilidades que tem a particularidade de submeter a si o humano-genérico e de colocar as necessidades e interesses da integração social em questão a serviço dos afetos, dos desejos, do egoísmo do indivíduo”.

Diante da moral e, portanto, das questões do humano-genérico, o homem sofre a inibição, o veto, o que seria isto uma das funções da moral. Outra função seria exatamente a transformação, a “culturalização das aspirações da particularidade individual”. Ainda Heller: “por mais intenso que seja o esforço ‘transformador’ e culturalizador da moral, não se supera sua função inibidora e essa se impõe na medida em que a estrutura da vida cotidiana está caracterizada basicamente pela muda coexistência de particularidade e genericidade”. Nesse sentido, voltando-se agora novamente para a prática tecnicista do jornalismo, faz-se com urgência a necessidade de discutirem-se antigos modelos elitistas que são, na verdade, moralizantes, e que tendem a ampliar a distância entre o jornalista, enquanto indivíduo inserido numa vida cotidiana, da própria cotidianidade na qual os fatos estão imersos.

Em contato com as pessoas, o jornalista tende a abstrair as propriedades delas, as quais julga serem de menos importância para o momento (ou fato). Ao julgar, selecionar e tentar adequar o fato para a prática jornalística (e não o contrário), o jornalista está procurando homogeneizar as relações, o cotidiano que o cerca, buscando a elevação máxima ao genérico. Porque é neste plano que a crítica se faz; é aí onde pode-se conseguir aprofundar pontos que na cotidianidade acontecem de maneira superficial. O problema é que esta elevação máxima ao genérico é algo excepcional; a maioria dos homens não vive a tensão de, como é o caso de moralistas, estadistas, cientistas e artistas, fazer com que o elemento necessário de sua essência, da atividade básica de suas vidas, seja o humano-genérico.

Portanto, a prática jornalística carece de uma decida à cotidianidade, dando importância também a espontaneidade dos fatos, às “motivações efêmeras, em constante alteração, em permanente aparecimento e desaparecimento”.

Atento à vida cotidiana, o jornalista escapa às armadilhas de modelos que foram a ele apresentados como as únicas alternativas para a realização de uma prática comprometida, como se diz, com a verdade e a objetividade. É na vida cotidiana que a espontaneidade, o pragmatismo, o economicismo, a analogia, os precedentes, os juízos, a ultra generalização, a mimese e a entonação se fazem presentes. E é a isso que o jornalismo deve se ater, na tentativa de fazer a cotidianidade falar por si mesma.

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