sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Memórias e a armadilha internética

Por Vitor Sion

Poucas são as pessoas que assumem ter uma rotina tranqüila, sem correria. A grande maioria de meus amigos e conhecidos sempre reclama de falta de tempo e eu não sou diferente.

Faculdade de jornalismo na PUC, de História na USP, estágio e, claro, um pouco de tempo para ficar com os amigos e a família não podem ser esquecidos. Mas o tempo passa rapidamente, chegamos ao final do semestre e eu preciso de algumas horas para fazer um artigo para a disciplina Jornalismo Comparado II.

Então aqui estou eu, em uma quinta-feira à noite, para cumprir minha obrigação estudantil. Acredito que a análise de uma passagem do meu dia possa, quem sabe, servir de reflexão para a disciplina.

Durante a tarde de hoje, ao abrir um link com uma matéria sugerida por um colega de classe, me deparei com uma propaganda da nossa amada Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, com a seguinte frase: “Cada vez mais, os melhores motivos para sentir orgulho da PUC”.

O que era para ser apenas mais um bordão publicitário, acabou por dominar a minha mente por um motivo: ao lado da frase, a figura central da propaganda era o deputado Michel Temer (PMDB-SP).

Não sei se eu captei a ideia da Universidade para a qual, indiretamente, eu escrevo estas linhas, mas a trajetória acadêmica e política do cidadão em questão seriam duas das principais razões para se ter orgulho dela?

Talvez eu esteja me desviando um pouco das reflexões sobre o jornalismo e o sentido da informação, que são a finalidade deste trabalho, então é melhor eu começar a citar os textos da disciplina, a fim de evitar o mau estar de ter que reescrevê-lo no ano que vem.

Em “Informação e Sentido”, Paulo Serra, da Universidade da Beira Interior, cita Baudrillar e diz que “’estamos num universo em que existe cada vez mais informação e cada vez menos sentido’, em que à ‘inflação da informação’ corresponde uma ‘deflação de sentido’”.

Dessa forma, seria muito melhor que a PUC escolhesse um cidadão desconhecido para ser o “garoto-propaganda” da universidade, ao invés de tentar chamar novos universitários através do “parlamentar mais influente do país”, como ostenta o site do próprio Temer.

Até porque, eu, particularmente, lembro de outras características de Temer além do fato de ele ser deputado – desde 1989, ininterruptamente, diga-se de passagem. Utilizando um provérbio popular, se minha memória não me engana, Temer foi um dos políticos que viajou à França, sem pagar nenhum centavo, com dinheiro do governo europeu. A razão da viagem: estudar a compra de equipamentos militares franceses que, algum tempo depois, foi consolidada, mas acredito que seja melhor deixar isso de lado para evidenciar a discussão sobre a memória, que também é proposta por Serra, não o governador do estado de São Paulo.

Em sua conclusão, Serra coloca que “a memória é tão essencial à construção (e definição) da subjetividade, da identidade individual, como à interpretação, à atribuição de sentido”. Em outra passagem, o autor ainda ressalta o projeto dos “teorizadores da sociedade da informação” que, através dos computadores, desejavam “registrar, conservar e transmitir todas as memórias – garantindo, assim, a abundância de sentido”.

A comparação, ainda que um pouco esdrúxula, entre a memória dos seres humanos e dos computadores, pode nos levar a discussão sobre as diferenças de se realizar uma pesquisa através das enciclopédias ou pela internet.

A geração que atualmente está nas universidades, com seus 20 e poucos anos, talvez tenha sido a última que utilizava livros e enciclopédias antes de “entrar no Google”, isso devido a uma questão temporal.

Para o meu irmão de treze anos, qualquer dúvida pode ser resolvida pelo Google. No entanto, o que pode parecer um instrumento facilitador, acaba por se tornar perigoso se lembramos do conto do memorioso Funes. O referido personagem tinha uma memória extremamente boa, mas não conseguia selecionar as informações mais importantes para cada momento de sua vida.

A possibilidade de se perder frente à imensidão de informações oferecidas pela internet está longe de ser uma mera hipótese ou fantasia do conto de Funes. Eu mesmo, durante o desenvolvimento deste trabalho, fui traído inúmeras vezes pelas alternativas oferecidas na web. Entre uma notícia e outra, o que era para ser feito em pouco mais de uma hora, me tomou quase três. Trata-se da armadilha internética!

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