segunda-feira, 30 de novembro de 2009

O papel da internet e a enciclopédia de papel

No início da minha vida escolar, não existia nada melhor que a enciclopédia para estudar e fazer os trabalhos pedidos pela professora do ginásio. Eram vários livros de diversas coleções. As cores eram vibrantes e em pouco tempo já sabia qual tema estava em qual volume. A biblioteca ficava na garagem, não por ser indigno dos ambientes mais visitados da casa, mas pelo silêncio que o cômodo proporcionava. Mesa, luminária, canetas, várias folhas, marcadores de páginas e pronto. Bastava encontrar o livro. Digo encontrar, pois acreditava não haver temas abordados na escola que não estivessem nos livros vermelhos de capa dura, ou nos verdes com folhas já amareladas que cortavam os dedos de quem não tivesse cuidado ao folheá-las.

Com o passar dos anos percebi que os trabalhos escritos à mão deram lugar aos impressos pelo computador, e que eram cada vez maiores, com figuras coloridas, cheias de legendas. As notas dos meus trabalhos, feitos com base na enciclopédia e escritos à mão passaram a receber notas cada vez mais baixas. O conteúdo estava errado? “Não!” - dizia a professora. “Apenas comparando com o dos seus colegas, o deles está muito mais completo.” Esse foi o primeiro momento que senti a necessidade de um computador com acesso à internet.

Idealizada e desenvolvida às luzes das ideias iluministas francesas, o projeto da Enciclopédia (de D'Alembert e Denis Diderot) foi inovador. A maior inovação veio pelo formato adotado: o método do dicionário, organizando os artigos por ordem alfabética. Em cada tópico era apresentado o campo de conhecimento ao qual ele pertencia. O recurso mais inovador, porém, foi a chamada referência cruzada.

A referência cruzada é inter-relacionamento de temas, ou seja, um tópico remete a outro tópico relacionado ao mesmo tema. Nos dias de hoje, o conceito pode ser comparado a um tema relacionado na página de pesquisa ou ao hiperlink, comum em páginas da internet, principalmente na Wikipédia. Este recurso aumenta o leque de pesquisa sobre o tema e amplia a abordagem do tema.

Os autores de "Informação e Sentido" e "O projeto da enciclopédia e seus registros sobre o jornalismo", Paulo Serra e Antônio Hohlfeldt, respectivamente, recontam a criação da enciclopédia como uma forma de eternizar e registrar a memória. A enciclopédia é, nada mais, que um grande arquivo de história, geografia, política, ciência, enfim, do conhecimento humano que seus criadores acharam pertinente estarem contidos nesse registro.

A inovação não foi apenas em sua concepção. A enciclopédia representou também um marco na evolução das formas de organização do saber. Ao identificar que o conhecimento tradicional estava baseado em superstições e preconceitos, seus idealizadores apostavam na razão como único meio para se chegar à verdade. A partir dessa filosofia, houve o rompimento da versão católica da revelação como base da ciência.

O processo enciclopédico representava a institucionalização dos dados organizados a partir de uma única visão, de certa forma inquestionável e inalterável. A Internet veio a resolver alguns dos problemas enfrentados pela enciclopédia. O primeiro deles é a infinita capacidade de armazenamento. Com espaço ilimitado, nenhuma informação era descartada. Não havia mais necessidade de adequar-se a um espaço delimitado por bordas de livros. Foram eliminados também os problemas de desatualização, já que o conteúdo publicado pode ser alterado a qualquer momento. Reduziu-se ainda, e muito, o tempo de pesquisa. Se a cada atualização de conteúdo, fosse necessário editar uma nova versão da coleção, esta jamais ficaria pronta. A publicação da primeira edição consumiu mais de 20 anos de seus escritores. Quando chegassem às lojas, não era de se espantar que algumas informações já estivessem ultrapassadas.

A popularização da pesquisa online e a inserção livre de conteúdo não fiscalizado causaram um novo problema, até então desconhecido e, no início, de difícil compreensão por algumas pessoas: a falta de credibilidade das fontes contidas na internet.

Resultados de pesquisas no Google reúnem milhares de fontes, sem discernir a idoneidade de cada uma delas. Compila todos os resultados encontrados, incluindo blogs e comentários pessoais. Em páginas como a Wikipédia, cujo slogan é “a enciclopédia livre”, qualquer um pode consultar e até alterar o conteúdo das páginas. Se por um lado isso democratiza a informação, por outro gera dúvidas e desconfianças do que pode ou não se confiar. Podendo optar, ainda fico com a atualizada, mesmo que não 100% confiável, internet. Já dizia minha professora do ginásio.

(Aline Boniolo - 06004503)

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