segunda-feira, 30 de novembro de 2009

A credibilidade da informação na era virtual

Evandro Ruivo


As informações que circulam no ambiente da rede mundial de computadores têm papel fundamental na formação crítica do mundo contemporâneo. Sites, blogs, e afins, são formas modernas de acesso e troca de informação, porém esbarram no mesmo problema de sempre, a fonte fornecedora.
O indivíduo pode acessar e ser acessado por milhões de pessoas. Os números são estratosféricos. A aparente ilimitação da circulação de conteúdo esbarra na chamada “superexposição”, invertendo o papel inicial que era o do acesso irrestrito às informações.
Os iluministas D’Alembert Diderot, artífices da “Enciclopédia Francesa”, tentaram racionalizar uma maneira de reunir e popularizar o conhecimento humano, compilado até aquele momento. Dentre outras evoluções na agregação desse conhecimento, eles iniciaram a forma cruzada de pesquisa de informações. Anteciparam em mais de um século a formatação que hoje a rede mundial de computadores utiliza. Desse modo, a pesquisa de verbetes na internet parece infinita, como desejavam os enciclopedistas. Naquele tempo, os realizadores da Enciclopédia tinham como base os empiristas John Locke e Francis Bacon. E ainda como colaboradores atuantes, nomes do calibre de Voltaire, Rousseau e Motesquieu.
Como todo texto impresso tem suas limitações quanto à atualização, além de outros problemas com a formatação, o modelo proposto pelos enciclopedistas foi questionado e relegado ao segundo plano, especialmente pelas novas enciclopédias surgidas a partir dos anos 70.
Paulo Serra, no texto “Informação e Sentido – Notas para uma abordagem problemática do conceito de informação”, esclarece as limitações e falhas no processo. De início, vislumbra a impossibilidade de rápida atualização, haja vista que a Enciclopédia demorou cerca de 22 anos para ser completada.
A atualização também traria outro inconveniente ao espírito da concepção original, qual seja, deixaria de ser um resumo de aspectos e fatos relevantes do conhecimento, demandando maior volume de páginas.
Um outro problema detectado por Serra é o critério para a escolha da organização sistemática. Segundo o autor, se adotarmos qualquer método, dentre a infinidade disponível, estamos fazendo-o aleatoriamente, arbitrariamente. Disto decorre outro problema: a escolha da informação a ser prestada. Como separar as informações de cunho científico e cultural das meramente cotidianas.
A rede mundial de computadores poderia solucionar estes problemas. Quanto à atualização, esta é cada vez mais instantânea, relegando o tempo de emissão e recepção a segundos. Como o campo de pesquisa é quase ilimitado, a rede de computadores não necessita fixar um método de organização e sistematização para obtenção do conhecimento. As variáveis de pesquisa e método são quase infindáveis.
O terceiro problema seria a capacidade de armazenar todo e qualquer conhecimento. A solução é obtida pela rede de computadores, pois esta elimina a necessidade de um suporte material para abrigar as informações. Decorre daí outro problema atualíssimo, que é o excesso de informações.
Segundo Serra, a perda do sentido da informação é o contraponto das soluções que a rede de computadores trouxe na busca pelo conhecimento. Lembrando a lição de Platão, Serra demonstra o paradoxo de que, se não tem conhecimento sobre o que fazer com a informação, esta de nada serve. Funes, o memorioso, de Jorge Luis Borges, releva a personificação da realidade virtual que estamos vivenciando. Nada adianta ter tanta informação armazenada, se o sentido lhe escapa. Não adianta ter acesso e arquivar tantas informações, sem o correspondente sentido. O sentido que Funes não conseguia dar à quantidade infinita de informações e detalhes que memorizava naturalmente, ou pelo esforço de relembrar as passagens de dias inteiros.
Por outro lado, o hipertexto virtual encerra a finalidade que os enciclopedistas pretendiam. As diversas formas de organização e sistematização do conhecimento estão contidas na rede de computadores. O projeto enciclopedista avançou mesmo um século depois de pensado. Desde o Memex de Vannevar Bush até o World Wide Web, de Tim Bernes-Lee, o enriquecimento cultural da humanidade encontra-se no Projeto enciclopedista. Uma das diferenças essenciais é que na Enciclopédia, os autores escolhiam as informações baseados em um conjunto de sistemas interdependentes entre si. No hipertexto, estas escolhas são fragmentadas, fugindo do conjunto sistematizado de organização do conhecimento.
Nos últimos 50 anos, a humanidade evoluiu tecnologicamente, mais do que em toda a sua história. Com essa evolução e o acúmulo de conhecimento, esperava-se uma certa emancipação da população como um todo, a ponto de o conhecimento ser acessível à, pelo menos, maioria dos povos do planeta. O que acontece é exatamente o contrário. A revolução tecnológica de ponta concentra-se nas mãos de poucos. Essa concentração também se verifica na rede mundial de computadores. As grandes corporações, incluindo os meios de comunicação de massa, entupiram o sistema, fragmentando as informações e dando a aparência de uma democratrização do conhecimento. O jornalismo tem papel de suma importância na intermediação entre a coleta de dados e o sentido a ser dado àquela informação.
O registro, a conservação e a transmissão da informação, como queriam os enciclopedistas, ainda não foi realizado pelo tráfego virtual. Carece de acesso múltiplo a uma cultura social de maior amplitude e maior alcance. Enquanto o sistema estiver restrito a uma parcela minoritária da população, não haverá emancipação da sociedade, quer por meio do papel impresso, quer por meio vitual.
O que hoje realmente atrapalha o desenvolvimento na troca de informações no hipertexto é exatamente o excesso inconsequente de dados na rede de computadores. A maioria das fontes emissoras de informações colocadas no sistema virtual ainda carecem de credibilidade. A responsabilidade, a ética, a veracidade, dentre outras questões humanas, ainda não estão na pauta das fontes originárias das informações arquivadas na internet.

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