sábado, 28 de novembro de 2009

Lívia Scatena – Jornalismo noturno 06000509

Eis que num belo dia surgiu a salvação dos estudantes desesperados: a Wikipedia. No ano de 2001 o site foi lançado, com objetivo de ser uma enciclopédia livre, plurilíngue e cuja colaboração na elaboração de verbetes e artigos partisse dos próprios usuários. Enfim, uma ideia moderna e visionária, perfeita para o século XXI das máquinas e computadores.

A mãe dos afoitos por informações rápidas e de fácil acesso é na verdade filha de uma grande conhecida dos que estavam na escola nos tempos pré-interneticos: a enciclopédia de capa, folhas e índice remissivo.

Na França de ideias iluministas do século XVIII, pensou-se numa forma diferente para classificar conhecimentos, tendo a razão (sempre ela) como fonte. O projeto nasceu como forma de disponibilizar as informações em sua época. É claro que nem toda informação poderia estar presente nos volumes enciclopédicos. Os editores (“homens das letras”, intelectuais) deveriam selecionar aquelas que se mostravam mais adequadas ao novo formato. Tudo o que fosse atraente e interessante deveria constar nos volumes, mesmo que tais qualidades não abrangessem aquilo que fosse mais instrutivo.

Ao enciclopedizar certos assuntos e deixando outros de fora, faz-se um recorte arbitrário daquele tempo: os editores responsáveis pelos volumes escolheriam os temas que deveriam ser rememorados pelas próximas gerações, apagando, definitivamente, tópicos que não se mostraram suficientemente interessantes para eles. Dessa forma, acabaram restringindo a memória do passado aos que a estudariam tempos depois. A escolha arbitrária daquilo que deve ser lido na posteridade é uma das críticas que Paulo Serra faz à enciclopédia em seu texto “Informação e sentido”.

É verdade que a enciclopédia nasceu com esta função seletiva (de reunir somente o essencial), mas acabou construindo uma memória coletiva eliminando outra. Ao reunir informações sobre todo e qualquer assunto disponível, gerou um gosto pelo não especializado, pelo verbete dicionarizado, cuja função é definir sem acarretar discussões.

Com o passar dos anos o conteúdo só tenderia a aumentar, claro. Tal fato acaba contrariando os objetivos da enciclopédia: se somente o relevante deve constar em suas páginas, como selecionar ainda mais os fatos lá acumulados para que caibam em 8 volumes?

Em tempos de enciclopédia virtual, tudo é muito diferente. A capacidade de memória que tem um computador pode ser imensurável, o universo on-line pode tudo armazenar, irrestritamente, imediatamente. Confia-se mais na memória da máquina que na pessoal. Tudo é esquecível, pois num clique do mouse o “tudo” pode ser rememorado e redescoberto. Toda notícia veiculada on-line é imediata. Para qualquer informação desejada, o Google dá resultados. Não há assunto para o qual não se ache respostas, ainda que não se possa confiar cegamente nelas.

Na tela inicial do site Globo.com, um dos grandes portais brasileiros, são cerca de 200 hiperlinks de assuntos diversos: Copa do Mundo, Big Brother Brasil, a novela das 21h, além de política internacional, editorias para cada grande cidade do Brasil, etc. É informação demais (muitas vezes de qualidade e veracidade extremamente duvidosas) em apenas um local.

O culto à cultura inútil e à informação descartável parece mesmo ter chegado a níveis antes impensados, tornando impossível, ainda segundo Paulo Serra, “ distinguir o memorável e o desprezível.”

Não deixa de ser verdade que existe hoje um culto também a tudo aquilo que é virtual. As pesquisas escolares feitas on-line, por exemplo, tornaram-se meras desculpas para a preguiça de enfrentar as dificuldades de consultar livros. As informações muitas vezes não se adéquam àquelas que se esperava, mas às vezes o “pesquisador” (ou fuçador virtual) não consegue identificar erros ou discordâncias, justamente por não estar acostumado a “discutir” com o texto que acaba sendo apenas um mero definidor de verbetes.

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