quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Manter O Mundo Comunicacionalmente Unido Não É Mante-lo Informado

A enciclopédia de Diderot, da idéia utópica de reunir em volumes todo o conhecimento, foi mais bem sucedida do que a internet, pelo menos até agora. Esta iniciativa, concretizada somente pelos Iluministas, mas idealizada antes deles por outros como Isidoro da Sevilha, tinha como objetivo não só reunir o conhecimento da época em uma coleção de livros, mas também torná-lo acessível à população, democratizando a informação. Certamente uma causa nobre, e inviável do ponto de vista comercial das editoras, isso se desconsiderarmos ainda que era impossível para a maior parte da população da época pagar pelos volumes. A censura oficial pesava sobre os textos, e os autores precisavam tomar cuidado com o que escreviam. E apesar de tudo, cumpriu ao menos parte de sua promessa – reuniu brilhantemente boa parte do que se sabia do mundo, de forma crítica e raciocinada (como diz o título da obra).

Comparativamente, a internet surgiu, tecnicamente, da tecnologia para interligar e manter conectados computadores e centrais informatizadas dos militares americanos. Depois, partiu para universidades, mas ainda era intranet, e por fim tornou-se aos poucos isso que vemos todos os dias. Ao ser disponibilizada para o público em geral, essa nova mídia, cheia de possibilidades, foi pensada como um projeto semelhante ao de Diderot: democratizar o acesso à informação, formando um enorme banco de dados com todo o conhecimento possível, e acesso para todos. Porém, como nada é de graça nessa sociedade em que vivemos, cujo propósito não é nem será, ao menos no futuro próximo, de esclarecer as massas, houve um imediato desvirtuamento dessa premissa.

O acesso às informações na rede mundial de computadores é amplo, abrangente, quiçá democrático, mas falha na própria definição do que faz, ou melhor, do que não faz: informar. O volume de dados movimentados na World Wide Web só em 2008 foi de 453 exabytes (segundo IDG Now!), o mesmo que 4,74 trilhões de livros digitalizados. O óbvio, porém, é que desta quantidade monstruosa de discos rígidos preenchidos (na casa dos 19 bilhões), ao menos 60% é repetição, propaganda, spams e outros conteúdos menos dignos de nota, menos profundos, menos intelectualizados. Em suma, menos.
É fácil confirmar estas estatísticas, já que é sabido que a maior parte das pessoas entra na internet para relacionar-se com amigos (sempre pela distância segura do MSN, Orkut e afins), bisbilhotar bizarrices e divertir-se com futilidades. Existem, ao menos como sites populares da rede, somente duas fontes de informação assemelháveis à enciclopédia de Diderot: a Wikipédia e o Google Books. Mas são assemelháveis, com propostas diferentes da reunião de conhecimento da época Iluminista.

A enciclopédia virtual Wikipédia parte do princípio que qualquer pessoa pode escrever um artigo e publicá-lo na rede, onde outros terão acesso. Parece ótimo, mas os problemas não demoram a surgir. Se qualquer um pode escrever o artigo, sem referências importantes, não pode ser confiável. O próprio formato do site foi desenhado para priorizar a quantidade de verbetes, esquecendo da qualidade. Não importa a profundidade do assunto, todos serão tratados com a devida superficialidade de sempre. Existem os moderadores, que excluem os posts supostamente incompatíves com a enciclopédia, seguindo critérios obscuros e pessoais, institucionais ou qualquer outro (na verdade não importa como escolhem os que serão deletados, não há discussão nem satisfações a ninguém). Portanto, se não se pode confiar nas informações dessa enciclopédia, de que adianta?

O Google, em toda sua onipotência (e onipresença, diga-se de passagem) na WWW, tem disponível em versão beta o buscador de livros digitalizados, como se fosse uma biblioteca virtual que compreende tudo o que já foi escrito (essa era a idéia, problemas com direitos autorais tem impedido a iniciativa). Não é o mesmo conceito dos Iluministas, mas aproxima-se bem do ideal que eles tinham em mente, se não fosse por uma questão: sendo o Google uma empresa que pretende lucrar com esse acesso, não seria de alguma forma tendenciosa esta biblioteca? Bom, é pagar pra ver. Se for seguir a mesma lógica do buscador comum, com links patrocinados, ordenados de acordo com a relevância e também com os patrocínios, pode funcionar em parte, e ser uma ferramenta útil, mas não a ideal. Afinal, parece cada vez mais distante esse ideal de um compendium de livre acesso e com a única pretensão de disponibilizar o saber. O objetivo de lucro nunca foi compatível com o acesso ao conhecimento.

Nem de todo mal é a internet, podemos não ter às mãos uma fonte de informações confiável, mas temos os microblogs! Temos redes sociais, comunicadores instantâneos, pornografia aos montes e todas as fofocas do mundo a um clique de distância! E ainda as notícias sérias, escritas em parágrados miúdos de forma pouco competente, reduzindo a função de jornalista a repassador de matérias de agências internacionais. O mundo jamais foi tão unido comunicacionalmente quanto é hoje, e tão cheio de informação. Uma pena que nisso tudo exista tão pouco a ser aprendido.

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