terça-feira, 10 de novembro de 2009

A nova enciclopédia

Para Robert Darton, “a obra suprema do Iluminismo foi a Enciclopédia de Diderot”. Pioneiros na organização efetiva de um livro que presumia trazer todo o conhecimento da humanidade até então, d´Alembert e Diderot organizaram seus quase 72 mil verbetes num esquema de “árvore do saber”, que divide todo o seu conteúdo em três partes: Memória, Razão e Imaginação.

Os enciclopedistas desejavam que sua obra se tornasse “um santuário onde os conhecimentos dos homens estivessem ao abrigo do tempo e das revoluções” e se diziam vaidosos por terem iniciado esse movimento, que procurava apresentar científica e racionalmente o seu conteúdo.

Os revolucionários da enciclopédia realizaram seu projeto em meados do século XVIII. No século XX houve grandes mudanças nesse assunto: entre os anos 40 e 60, a enciclopédia viveu uma época de desilusão; mas a partir dos anos 70 surgem obras inovadoras, como a Britannica, que propõem novas estruturas conceituais e apostam em modelos gráficos que visam favorecer a flutuação infinita das leituras possíveis.

Paralelamente a isso, desenvolve-se a Internet, rede mundial de computadores, e aprimoram-se duas de suas estruturas básicas: o hipertexto e o hiperlink. Com a criação da World Wide Web por Tim Bernes- Lee no final dos anos 80 e o início de sua popularização em 1991, essa ferramenta começou a trazer um novo significado para a enciclopédia.

Com a possibilidade infinita de acessos e novas descobertas, o hiperlink descaracterizou a enciclopédia como um lugar que concentra o saber, tornado o sistema acéfalo, de acordo com Olga Pombo. Anteriormente limitado numa coleção de livros, o saber humano foi pulverizado em centenas de milhares de servidores e agora trafega aos milhões de bytes a cada instante, ao redor do mundo.

A Wikipédia, enciclopédia virtual que permite na maioria dos seus verbetes atualizações de qualquer visitante, é o sinal dessa nova era. Como pontos positivos, temos logicamente a possibilidade de divulgação do conhecimento e a produção de informações que antes poderiam ficar restritas a pequenos círculos de pessoas (como por exemplo um escritor desconhecido que faz uma página sobre si mesmo).

Mas a atualização de conteúdo anárquica, que é totalmente democrática, tem suas mazelas: como garantir que as informações veiculadas, propositadamente ou não, não estão incorretas? Se nas enciclopédias impressas e editadas por importantes instituições sabemos que podemos confiar, o que dizer da credibilidade da Wikipédia?

São inúmeros os casos de vandalismo em páginas de assuntos ou pessoas polêmicas, que fizeram com que os responsáveis desse site bloqueassem seu conteúdo para edição. Por outro lado, a enciclopédia virtual traz fóruns de discussão sobre os verbetes, uma ferramenta interativa e extremamente positiva da Internet, algo impensável nas enciclopédias impressas.

A Wikipédia, de forma mais acentuada que outros sites, traz links dentro de suas páginas que apontam para outros verbetes. Isso permite que o internauta fique “à deriva” e navegue para onde sua curiosidade desejar, mesmo que o objetivo inicial fosse tirar apenas uma dúvida. Tal idéia pode ser comprada com a obra inicial de d´Alembert e Diderot, que utilizavam a chamada referência cruzada: um verbete poderia remeter a outro, como por exemplo em journal se referia a gazette. Essa vinculação conceitual antecipou os atuais hiperlinks, além de ter colaborado para que os enciclopedistas burlassem a censura da época.

Porém, além da questão da falta de credibilidade, outro problema assombra a Internet: o excesso de informação. A exemplo do conto Funes, o memorioso, de Jorge Luis Borges, que traz a história de um rapaz que tinha uma memória fotográfica, mas que não consegue organiza-la e seu conhecimento torna-se inútil e subutilizado, por estar decifrado.

Um dos defeitos da rede mundial de computadores é o mesmo de Funes, o excesso de informação e a pouca organização. Para Baudrillard: “estamos cada vez mais num universo em que existe cada vez mais informação e cada vez menos sentido, em que à inflação da informação corresponde a uma deflação do sentido”.

Mesmo com sites de busca cada vez melhor estruturados e iniciativas como a Wikipédia, Paulo Serra afirma que a seleção da informação mais importante é ainda uma tarefa quase impossível na Internet, pois não temos idéia da sua dimensão. De fato, sites protegidos por senhas ou criptografados, além de outras páginas que surgem a cada segundo, tornam a Internet similar ao Universo: algo gigantesco e incompreensível, que tende ao infinito.

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