sexta-feira, 19 de junho de 2009

As Pirâmides do Império Americano


“O Egito antigo foi duplamente favorecido e sem dúvida deveu sua riqueza mitológica às duas atividades que possuía, a saber, a construção de pirâmides e a busca de metais preciosos, cujos frutos... Não envelheceram com a abundância”
(Keynes)

Em A Teoria Econômica Keynesiana e a Grande Depressão o autor faz uma análise econômica e política da crise de 1929, de como os Estados Unidos chegaram a ela e de seus desdobramentos. O que mais chama a atenção no texto é o mapeamento de uma espécie de ciclo em que guerras, períodos de prosperidade e épocas de crise se sucedem, sempre nessa ordem em que um alimenta e resulta no outro.


Os Estados Unidos seriam, portanto o maior exemplo de economia construída com base neste ciclo. Com a Guerra Civil em 1900 houve um rápido período de expansão e prosperidade. O valor de mercado de todos os ativos econômicos norte americanos passaram de 86 milhões em 1900 para 361 milhões em 1929, elevando o país à condição de primeira potência industrial do mundo.


Mas a era de abundância foi abruptamente interrompida na Quinta Feira Negra, dia 24 de outubro de 1929, quando o valor dos títulos negociados na Bolsa de Nova Iorque iniciou sua trajetória descendente, comprometendo a confiança nos negócios. A conseqüência foi a diminuição da renda nacional e o desemprego em massa, que deram início ao período que ficou conhecido mais tarde como A Grande Depressão.

Entre 1929 e 1932, registraram-se 85.000 falências, mais de 5.000 bancos pararam de funcionar, o valor das ações na bolsa de Nova Iorque caiu de 87 para 19 bilhões de dólares, a renda agrícola reduziu-se a menos da metade, o produto industrial encolheu cerca de 50%, 12 milhões de pessoas ficaram desempregadas e um quarto da população se viu privada dos meios básicos de subsistência.

Difícil entender como um país no auge de sua prosperidade se precipita numa queda desenfreada rumo à decadência. É aí que entra Keynes para elucidar alguns pontos e tentar esclarecer esse mistério. Em primeiro lugar ele define o que convencionou chamar de fluxo circular. Simplificando, o dinheiro flui das empresas para o público na forma de salários e em seguida esse dinheiro retorna para as empresas quando as pessoas adquirem os bens e serviços oferecidos por elas.

Dentro desse fluxo circular Keynes identificou três formas de vazamento. A poupança, que no auge da prosperidade supera os empréstimos aos consumidores; a compra de bens e serviços de empresas estrangeiras (importações) e por fim o pagamento de impostos, que são também retiradas do fluxo rendas-despesas.

Ainda segundo o economista esses vazamentos poderiam ser compensados da seguinte maneira. Os empresários deveriam financiar investimentos com dinheiro emprestado nos bancos onde estão depositadas as poupanças, as importações poderiam ser contrabalançadas pelas exportações e o governo usaria os impostos para financiar a aquisição de bens e serviços.

Por essas e outras Keynes considerava difícil que o processo, da maneira como acontecia até então, funcionasse por muito tempo sem quebras e crises. Ele constatou que indivíduos mais ricos tem o hábito de poupar mais dinheiro assim, quando elevado o nível das rendas, uma porcentagem maior de dinheiro deixará de circular, transformando-se em poupança. Para evitar que isso aconteça os investimentos teriam que crescer mais rápido que a renda. Mas em qualquer economia capitalista “madura” há um limite de oportunidades para investimentos lucrativos. É então que caem os investimentos e com eles os gastos com bens e serviços. Resultado? Crise!

A crise nos parece então um problema que o capitalismo terá que enfrentar enquanto insistir na manutenção de seu sistema, já que esse colapso vem de uma falha estrutural dele próprio. O que Keynes, Marx e Hobson tinham em comum? Os três consideravam como causa fundamental da depressão econômica a inabilidade dos capitalistas para diversificar as formas de investimento tornando possível contrabalançar os níveis crescentes de poupança.

A solução proposta por Keynes já é muito conhecida, pois foi aplicada com sucesso nos Estados Unidos. Ele sugeriu que quando a poupança excedesse os investimentos, o governo deveria entrar em cena, recolhendo o excesso de poupança por meio de empréstimos e investindo em projetos de utilidade social que gerariam empregos e melhorariam a qualidade de vida das pessoas. Parece perfeito e de fato seria se não fosse pelo pequeno toque que serviu de catalisador para esse processo, a guerra.

A Grande Depressão prolongou-se por toda a década de 30, até a eclosão da Segunda Guerra Mundial. Entre 1939 e 1944 a produção das fábricas, minas e indústrias triplicou, a produtividade cresceu 50% e o desemprego cedeu rapidamente. Em 1940 as despesas de caráter militar totalizaram 3,2 bilhões de dólares ou 3,2% do PNB. Em 1943, no auge da guerra, os lucros relacionados à ela eram quase 40% do PNB, atingindo níveis sem precedentes.

Isso não lembra alguma coisa? 1900... Guerra civil... Prosperidade... Crescimento da economia... Pois é, o ciclo a que me referia no primeiro parágrafo. As despesas militares desempenham nos Estados Unidos o mesmo papel que as pirâmides na economia do Egito Antigo.

Mas é aí que está o problema e o autor não deixa de fazer a crítica a esse processo tão absurdo. Ele alerta para a negligência com que as conseqüências dessa prosperidade sustentada pelo militarismo vem sendo encaradas. A teoria keynesiana foi profana e está sendo aplicada de maneira inconseqüente. Segundo o autor, esse tipo de teoria econômica está nos conduzindo a “uma visão anti-histórica, tecnicista, mecanicista e apolítica do que é a economia e de como ela funciona” e eu ainda acrescentaria desumana.

Gostaria de deixar por fim um alerta, uma dúvida que me assusta. Lembrando da polêmica em torno da questão nuclear na Coréia do Norte e considerando os conflitos em torno das eleições no Irã. Acrescentando ainda as tendências observadas no último século e considerando que os EUA atravessam um período de recessão, será que devemos esperar o início de uma nova guerra? O fato é que se estivéssemos ainda na era Bush ela já estaria acontecendo. Será que Obama conseguirá agregar os conselhos dos velhos economistas e diversificar as formas de investimento? Será que o império americano descobrirá um jeito mais digno de salvar sua economia? Quem viver verá!



Nenhum comentário:

Postar um comentário