sexta-feira, 19 de junho de 2009

A crise especulativa

Se a quebra da Bolsa de Nova York em 1929 provou algo, foi que o aumento do poder aquisitivo da população não significa necessariamente um impulsionamento da economia. Isso porque junto ao desenvolvimento industrial dos Estados Unidos cresceu também o número de bancos e o conceito de armazenamento de capital, que mais tarde levou ao crescimento das famosas "poupanças". E assim, indo contra o conceito inicial de capitalismo, o dinheiro guardado deixa de movimentar a economia, e a demanda por produtos industriais cai, gerando excedentes de produção, que por sua vez geram um excesso de oferta que derruba os preços, e assim por diante. Esse percurso básico quebrado pelas poupanças, denominado por John Keynes em sua análise sobre a grande depressão como "fluxo circular", é um conceito teoricamente infalível, mas que possui em si mesmo brechas como as que levaram à crise de 29.

Se à princípio parecia óbvio que as pessoas precisavam de dinheiro para adquirir bens e serviços industriais, na mesma proporção que o mercado precisava desse público consumidor para se movimentar, o aumento do poder de compra acabou gerando um novo meio de aumentar o capital, o investimento. E assim como ocorreu no início do último século e se repete atualmente na crise financeira que o mundo enfrenta, o investimento de capital em títulos e seu rendimento acabou gerando um montante que só existe no papel.

Uma das propostas de Keynes no período para reverter o desvio de capital do fluxo econômico que levou à quebra da bolsa era justamente que as empresas adquirissem empréstimos nos mesmos bancos em que seus funcionários criavam poupanças. Porém, ao mesmo tempo que esses investimentos levavam o capital de volta à sua origem, seu rendimento acabava por aumentar o valor aplicado nas poupanças e, consequentemente, o dinheiro em forma simbólica. O novo problema seria corrigido, segundo o autor, se o resultado de tais investimentos gerasse um
novo capital, superior a essas poupanças, o que no caso mais recente, de 2008, não ocorreu, chegando ao limite que culminou na atual crise.

A diferença é que, se em 1929 nos possuíamos um excesso de capital na forma material, ou seja, no excedente de produção destas empresas, o que ocorre hoje e torna o problema maior é que cada vez mais os investimentos de poupanças são aplicados em títulos e outras formas de capital especulativo. Dessa forma, assim comooscila muito o valor de determinado investimento - para citar um exemplo, a constante variável das companhias aéreas, que ganham e perdem investidores a cada grande acidente com repercussão na mídia. E se um excesso de capital na forma de bens materiais pode ter seu valor revertido através de cortes de produção ou na diminuição de preços, com o capital especulativo o crescimento e, consequentemente, o excesso, é apenas simbólico. E como dizer para uma pessoa que economizou anos de salário que seu banco não possui o dinheiro correspondente ao seu rendimento?

Em seu período, Keynes propunha que o governo absorvesse o excesso de capital aplicado nas poupanças, e o revertesse na forma de medidas públicas que equilibrassem o acúmulo de capital ao investimento das empresas. E assim como sua medida intervencionista foi criticada na época, o mundo chega hoje ao momento de um novo colapso, em que tal medida se fará necessária, mas de forma ainda mais prejudicial. Pois o que antes foi proposto como um direcionamento da aplicação, agora se resume ao fato de que tal capital especulativo não existe em forma real, e não representa nenhuma possibilidade de utilização, seja pelo investidor ou pelo governo que se apoderaria do valor. E assim, o mundo chega ao momento de concordar com Keynes, porém tarde demais, deixando de apoderar-se de uma riqueza real e colecionando títulos de valor imaginário.

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