segunda-feira, 22 de junho de 2009

Na era da irracionalidade, os perdedores são sempre globais

“Produzir onde os salários são baixos, pesquisar onde as leis são generosas e auferir lucros onde os impostos são menores”. Apesar de cruel, esta frase foi divulgada pela revista alemã Wirtscha Fiswoche, e resume bem o que o artigo de Roberto Kurz busca desconstruir e analisar. Na apresentação de Roberto Schwarz, é observada a “dinâmica e a unidade ditadas pela mercadoria fetichizada - o anti herói absoluto - cujo processo infernal escapa ao entendimento de burguesia e proletariado, que enquanto tais não o enfrentam". Mercadoria fetichizada. Assim como este conceito foge de um entendimento instantâneo, o homem também não consegue notar como é essa idéia que o move no dia a dia.

A mercadoria fetichizada e o padrão de consumo efêmero são regras que passaram a ditar o movimento da sociedade. Isso porque tudo passou a girar em torno do celular ou o carro do ano. A burguesia lançou uma tendência que o proletariado tenta acompanhar desesperadamente. Mas essa burguesia, que no início fazia os reféns, também acabou presa em sua própria armadilha, como se pode constatar nas épocas de crise. A frase que abre o texto de Kurz faz com que o leitor logo pense na crise financeira que assola o mundo. E como o texto não foi escrito precisamente sobre o assunto, acaba parecendo uma premonição sobre a situação atual da economia.

Kurz aponta como a economia de mercado moderna surgiu em meio às nações firmadas no século 18, já que o estabelecimento dos Estados implicava em um conjunto de leis e regras para lidar com o capital produzido no território. Em meio a isso, o mercado mundial era visto como um “comércio externo” e deixado em segundo plano. Mas a partir da década de 80 surge um mercado único e global, impulsionado pelos avanços tecnológicos que permitem uma fácil comunicação entre as nações em todas as partes do mundo. Então tudo passa a ser negociado, até mesmo órgãos humanos e mão-de-obra barata.

Este mercado mundial ultrapassou limites territoriais, chegando aos locais mais remotos, inclusive às nações de economias subdesenvolvidas. Empresas com tecnologia de ponta passaram a estabelecer filiais em países com baixos custos. E assim, quem era rico passou a ficar mais rico, e quem era pobre, ainda mais miserável. Isso porque a indústria nacional se viu, em pouco tempo, incapaz de competir. Pequenas e médias empresas faliram e o capital ficou concentrado nas mãos dos empresários mais influentes.

Kurz cita a criação da Ford e Volkswagen para explicar as multinacionais, apontando como no começo este novo sistema não afetava a coesão das economias nacionais. A partir da década de 60, o comércio mundial passou a crescer de modo mais rápido que a própria produção, então a montagem de um carro, como exemplo, não ocorria mais em uma única fábrica, mas em diversas filiais no mundo inteiro. Então o processo de produção tornou-se ainda mais alienado do que aquele já retratado por Charles Chaplin em “A era moderna”.

Quanto maior o investimento em tecnologia e racionalização da produção, maior também é o desemprego e a desvalorização da força de trabalho. Pode-se perceber como a racionalização da “lean production” é contrária à racionalização do operário. Os processos tornam-se cada vez mais alienantes, e a idéia do consumo exacerbado ainda mais presente até mesmo naqueles que não podem comprar os objetos que produzem. Sempre em busca de lucros maiores, as grandes empresas passaram a internacionalizar seus capitais. Assim, a fidelidade à economia nacional perde lugar e a estratégia de desenvolvimento econômico fica cada vez mais difícil, ainda mais em países subdesenvolvidos que não são detentores das grandes corporações. A economia privada avança todos os limites e o Estado continua em sua fronteira territorial. Assim fica mais fácil aplicar capital onde é conveniente. O Estado não importa. A nação não importa. A única regra que rege a economia é o lucro maior a qualquer custo.

“Zona de influência” e “zona de rentabilidade”. Assim são designadas diversas nações. Não há indivíduo ou vida, apenas poder de consumo em massa. E com o lucro da produção concentrado cada vez mais nas mãos de poucos, o poder de consumo das classes baixas fica cada vez menor. Então, para qual finalidade será toda a larga produção? É crise, é miséria, é necessidade de reestruturação em nível global, assim como a que vivemos hoje.

“Entretanto, são, sobretudo, as reações desesperadas dos homens 'cuspidos' do mercado que desencadeiam a crise do novo sistema mundial. Talvez essa nova guerra seja ainda mais dispendiosa do que a antiga Guerra Fria. A globalização de uma 'economia da minoria' tem como consequência direta a “guerra civil mundial”, em todos os países e em todas as cidades”. Kurz questiona como barrar essas evoluções, mas é difícil pensar, já que uma solução teria que ir contra o lucro absoluto das empresas. Por outro lado, também é improvável um retorno à economia nacional. E assim como diz Kurz, o que nos falta não são apenas mais aparatos econômicos que apenas ofuscam o sistema irracional. A necessidade maior é a globalização de uma nova crítica social.

Por Beatriz Carrasco

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