sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

A internet não tem razão

Até que ponto o excesso de informação tem nos deixado completamente desinformados. Por maiores que sejam os meios e as possibilidades de descobrirmos mais sobre tudo, mais nos afundamos no vazio. A obsoleta enciclopédia não teria nada a acrescentar a nossas mentes abarrotadas de espaços virtuais que muito pode trazer de novidade e pouco tem nos nutrido de real conhecimento?

E pensando em Funes, o memorioso, de Jorge Luis Borges podemos perceber o quanto que nosso grande afã diário faz de nós exatamente aquele que Funes critica no texto: vivemos como quem sonha, olhamos sem ver, ouvimos sem escutar, esquecemos de tudo, ou quase tudo. Excesso de informação? Seria de se perguntar até que ponto Baudrillard também teria razão ao afirmar que a construção de uma memória artificial, corporizada nos media, nos daria a garantia maior de um esquecimento perfeito.

Acontece que esse excesso de acesso a informação não nos garante o conhecimento. A internet, por exemplo, pode ser considerada a nova televisão com um milhão de canais. É uma tentação que distrai muito mais do que orienta.
Não acredito ser a enciclopédia o único caminho para o real conhecimento, porém não há como desconsiderar o seu valor diante de um mundo de incertezas que nos traz a internet. É claro que qualquer conhecimento pode evoluir a partir de novas descobertas. Porém, os livros ainda nos garantem uma maior credibilidade. A palavra escrita, ainda que tenha também o seu prazo de validade, no sentido de amplitude do que está escrito, nos deixa mais certeza sobre sua veracidade. Ao passo que ao atualizar uma página da internet, as informações não apenas aumentam como se modificam.

Toda aquela riqueza de detalhes exposta na tela do computador é tão fascinante e, ao mesmo tempo, tão irreal. Irreal no sentido de parecer um concentrado de opiniões e achismos que nem sempre correspondem à verdade. O valor do livro, ou da enciclopédia, como diria o filósofo Denis Diderot, está em agrupar os conhecimentos dispersos e expor aos homens, “a fim de que os trabalhos dos séculos passados não tenham sido trabalhos inúteis” e que os descendentes ao se tornarem mais instruídos, se tornem também mais virtuosos. Enquanto o mundo virtual desorganiza, os livros ordenam.

A grande vantagem do hipertexto para com a enciclopédia seria a rapidez de atualização. Esse atualizar poderia, então, garantir aquilo que ainda não garante racionalmente como informação concisa e segura. Isso por contar por diversas contribuições espontâneas, por vezes anônimas, que de certa forma trazem mais dúvidas do que aprendizado. Então, teríamos a ilusão, estamos atualizados.

A enciclopédia idealizada por Diderot e dAlembert, em 1750, trazia a novidade de trabalhar com a referência cruzada, isto é, um verbete poderia remeter a outro, o que garantia a consulta multiplicada quase ao infinito da obra. O que, de certa forma, antecipava em séculos o que fazemos ao clicar uma palavra destacada de um texto na internet, pulando diretamente para sua referência. Toda essa suposta agilidade proporcionada pelo mundo virtual parece fazer de nossa memória um depósito de lixo. Nossas escolhas, ainda que com “preocupações culturais”, acabam se voltando para uma informação mais acessível oferecida pelo mass media.

Essa condição ilimitada do hipertexto tem como efeito a banalização, a sobrecarga, a desorientação e a indiferenciação dos conteúdos veiculados. Claro que existem mecanismos de filtragem, os sites de busca oferecem esboço de seleção. Acontece que essa seleção só funciona na medida que o leitor tenha capacidade crítica de discriminação do que é importante ou não.
E de que forma adquirir um senso crítico se hipnotizados pela curiosidade disfarçada de ‘busca pelo conhecimento’ saltamos de novidade em novidade em busca de entretenimento ao invés da instrução. Se não há mais como realizar nosso ofício sem essa navegação sem bússola, não há mais como apreender nada. E devo lembrar Jorge Luis Borges novamente: “um jornal lê-se para esquecer, uma música também se ouve para depois se esquecer, é uma coisa mecânica, portanto fútil. Um livro lê-se para se reter na memória.”

A internet pode substituir o jornal diário, ainda que sem a devida credibilidade. Porém, a web está longe de substituir os ensinamentos dos livros. Talvez a enciclopédia, digna de tantos preceitos, devesse incorporar uma linguagem mais acessível e menos complexa para que não aconteça, por excesso de erudição, o mesmo que acontece ao passarmos os olhos pelo hipertexto, a impossibilidade de memória.

A grande questão é que a informação (importante) só tem utilidade para quem está informado (e conhece); a quem não está informado (nem conhece), de nada serve procurar essa informação nos sites de busca. Temos assim, dois tipos de internautas: aquele que procura para confirmar, ou rememorar, e outro, senão a grande maioria, que usa a internet como um desaprendizado ou como um meio de diversão, distração e esquecimento – aproximando-se cada vez mais, neste aspecto, da televisão.

Não sejamos nós vítimas da opinião alheia ou pertencentes a uma opinião pública que não se sustenta. Não deixemos que o poder publicitário governe nossas idéias e ações. O mundo virtual não tem um conteúdo de todo racional e lógico. Ele só poderá ser usado a nosso favor se fizermos o uso das bússolas. E que não nos enganemos, as únicas bússolas existentes ainda estão nas estantes.

Juliana Menz 05006894

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