segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Fora do papel

No final da década passada surgia o Google, um despretensioso projeto de dois estudantes americanos da Faculdade de Stanford. Em menos de dez anos a empresa de fundo de quintal se tornou uma das maiores corporações do mundo. As infinitas possibilidades de busca se transformaram em infinitos dígitos na conta da empresa. A idéia inicial era oferecer um site de busca mais avançado, com uma melhor navegação e uma maior qualidade de ligações.

Com 23 anos de idade acompanhei de perto a transição e a consolidação do mundo virtual. É impossível negar as inúmeras vantagens e recursos que são oferecidos, por outro lado sites de busca como google também perpetuam a preguiça entre bilhões de pessoas que se sentem acomodadas com as informações que são oferecidas. Em primeiro lugar, grande parte das buscas nos leva para informações pouco confiáveis. Para piorar esse cenário, o que é errado ou pouco elaborado, é perpetuado como verdade por outros sites que usam a informação como referência. Um ciclo sem fim.

Crianças utilizam a ferramenta para os trabalhos escolares, jovens buscam uma resposta rápida para um trabalho da faculdade, copiar as respostas da internet, infelizmente é cada vez mais corriqueiro. Nem mesmo as teses de doutorado e mestrado estão isentas dessa realidade, pipocam casos de trabalhos acadêmicos que foram copiados através da internet. Jornalista sem mobilidade nas redações, pressionados pela rapidez e pelo imediatismo também são pautados pelos sites de buscas, como confiar na informação?

Irineu Funes, personagem de Funes, o Memorioso, tem a incrível capacidade de lembrar de todos os acontecimentos. Uma representação perfeita dos sites de busca, onde ambos compartilham a incapacidade de reflexão sobre os acontecimentos, tudo é muito superficial.

Nesse mundo de informações e transformações a velha enciclopédia foi devorada pelas novas tecnologias. A lembrança do tempo de escola, da busca por algum tema naquela série de livros faz parte do passado. Com a busca virtual ganhamos tempo, direcionamos nosso olhar na busca de um único objetivo, aquele termo preciso escrito entre aspas. No tempo da enciclopédia era comum errar alguma página e ler sobre um outro assunto, ler a informação da página seguinte. Esse hábito também existia na busca por alguma palavra no dicionário, prática que também está ficando para trás, hoje buscamos uma definição nas centenas de dicionários virtuais. No mundo moderno um dos grandes problemas da enciclopédia é sua defasagem em relação aos acontecimentos recentes, no mundo virtual as informações são atualizadas em tempo real.

Paulo Serra defende em Informação e Sentido a visão que a internet responderia a um projeto de construção da memória por meio da informação, ele argumenta que o início desse projeto aconteceu no século XVIII com o advento das enciclopédias, um projeto que buscava reunir os conhecimentos para transmiti-los para as gerações futuras.

Em O Google e o futuro do livro texto publicado no Caderno Mais (dia 29 de novembro) o professor da Collège de France, Roger Chartier discute essa transferência da informação e do conteúdo dos livros para o mundo digital. Processo que começou com os dicionários online e com as enciclopédias onlines (wikipedia) e que é consolidado com o novo projeto do Google, a criação de uma livraria digital paga o Google Editions.

O autor alerta para o rompimento das relações que em todas as culturas escritas anteriores, ligava estreitamente os objetos, os gêneros e os usos. No mundo digitalizado, o discurso não se inscreve mais nos objetos, algo que permitia que ele fosse classificado, hierarquizado e reconhecido em sua identidade própria. Esse foi o destino da velha enciclopédia e parece ser o futuro dos livros, jornais e revista.

João Pontes (06004171)

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