“Washington, 02/06/2009, (IPS) – Apesar da crise econômica e do gasto militar sem precedentes, os neoconservadores dos Estados Unidos pressionam o Congresso para que aumente o orçamento das forças armadas.
Os representantes dessa corrente política direitista exigem do Congresso e do presidente Barak Obama que aumentem o gasto militar no próximo ano, inclusive além das projeções feitas pelo seu antecessor, George W. Bush. Também defendem que sejam destinados aos gastos com defesa dezenas de milhares de milhões de dólares do pacto de estímulo esconômico de quase US$ 1 bilhão, cuja aprovação legislativa para este mês é defendida por Obama.
Insistem em que um aumento dos contratos do governo com empresas militares norte-americanas se traduziria rapidamente em mais trabalho, quando o desemprego avança rapidamente para a casa dos dois dígitos. ' Este tipo de gasto não tem apenas sentido econômico, mas ajudará a fechar o histórico de profundo abismo entre a estratégia e os recursos militares dos Estados Unidos', escreveu no mês passado Tom Donnely, analista militar do Americam Enterprise Institute (AEI), uma organização de especialistas predominantemente neoconservadores.
'É nescessário estender pontes, e o mesmo ocorre com as ferramentas com as quais nossos militares combatem', afirmou Donnely, para quem o congresso deveria acrescentar pelo menos US$ 20 bilhões anuais ao atual orçamento da defesa. 'Um elemento crítico em qualquer recuperação será fortalecer as bases de uma economia global, construída cobre as garantias norte-americanas de segurança mundial', acrescentou.”
(http://www.mwglobal.org/ipsbrasil.net/nota.php?idnews=4518)
O trecho do início dessa matéria, escrita pelo americano Jim Lobe, pode provocar ultraje à sensata e fraterna opinião de que está mais do que na hora de acabar com gastos militares vultuosos e, obviamente, com a guerra. Mas, na verdade, ela não nos faz muito mais do que cócegas na nossa já defasada consciência de ser humano.
Afinal, já está no imaginário coletivo que os Estados Unidos da América – a terra da liberdade, ou apenas o da respectiva estátua – é, por excelência, o país da guerra. Lembro-me de como meus olhinhos de meninos de 5 anos brilhavam pelos bonequinhos dos “Comandos em Ação”, aquela linha de brinquedos militares politicamente corretos que fizeram a cabeça de muitos como eu desde a década de 70. O que mais me fazia salivar eram, na verdade, as miniaturas dos veículos militares ultra-tecnológicos, seus tanques, aviões, jipes e derivados; máquinas de guerra que habitavam os sonhos de cabecinhas como a minha de outrora.
Mas existe uma razão para tanto verde oliva nesse imaginário da segunda metade do século XX, e ela está, não no triunfo de toda essa tecnologia refletida pelos aparatos militares, mas lá atrás, nos soldadinhos de plástico da Segunda Guerra Mundial. Lembra? O fato é que esse conflito firmou, a partir de uma diretriz econômica, os EUA como o país da guerra, e para compreendermos essa diretriz a ideologia Keynesiana (da teoria do economista John M. Keynes ) se faz essencial, por ter dado a base teórica para políticas de estado que levaram ao armamentismo desenfreado norte-americano.
A crise de 1929, quando os títulos da bolsa de Nova York começaram a despencar vertiginosamente, acarretara um efeito dominó de falências e desemprego em massa no país. A economia que experimentara um progresso acelerado nas décadas precedentes, agora era motivo de enormes filas de famílias miseráveis em busca de emprego e comida; até uma onda de suicídios de empresários que vieram à bancarrota teve início.
Clamava-se por uma solução, e foi Keynes quem veio oferecê-la baseado numa fórmula bem simples: o valor dos bens e serviços produzidos em um país deve ser igual ao valor necessário para produzi-los (que é o custo de produção mais o lucro do empresário). Nesse caso, se a população consumisse todos esses bens e serviços, os patrões poderiam pagar os custos de produção (salários, máquinas, transportes etc) e ainda obterem lucro, que seria reinvestido na produção; esta que depois seria integralmente consumida; gerando lucro para reinvestimento; que geraria mais produção para ser consumida, etc. Keynes chamou esse processo de fluxo circular.
Mas sua grande sacada foi apontar defasagens nesse modelo, e a principal delas, na visão do economista, era a poupança. Keynes observou que era comum efetuar-se a poupança, como aconteceu no início do século, quando do progresso econômico a grande parcela da população que aumentara seu poder aquisitivo veio acompanhada de um aumento do número de poupanças nos bancos. Em outras palavras, quanto mais se ganhava mais se guardava.
Se o dinheiro será guardado ele não será gasto com os bens e serviços produzidos, logo não vai permitir reinvestimento na produção, gerando uma fenda no fluxo circular e uma grande dor de cabeça para os empresários: “afinal, para quem eu vou produzir?”. Ele resolve então pela contenção de gastos e retraimento da produção, o que acaba gerando desemprego (“sem querer”).
Para corrigir essa fenda que deu origem à crise da década de 30, Keynes afirma que os investimentos devem se orientar no sentido de “absorver as poupanças” através de: importação, que canalizaria o montante de produtos não consumidos internamente no país; direcionar impostos para a aquisição de bens; contração de empréstimos dos bancos para suprir o dinheiro que fora poupado. No entanto, ele acusa que os investimentos não podem promover um acúmulo maior de bens de capital, afinal isso geraria o efeito contrário uma vez que expandiria a produção que continuaria sem ter consumidores. Lembremos que estes estavam mais preocupados em guardar do que em gastar.
Nesse ponto ele propõem que o Estado se faça presente – já que o interesse das empresas seria sempre reinvestir dinheiro na produção, e nunca reverter o que não foi produzido para efetuar a distribuição de renda -, sendo que essa instituição é que faria empréstimos dos bancos e canalizaria o dinheiro das poupanças em projetos de utilidade social, tais como construção de escolas, parques, hospitais etc. Assim o dinheiro não ficaria ocioso.
Onde se encaixa a guerra nessa história toda? Ora, lembremos antes que a situação de então era de crise, falências, desemprego, pobreza; então não se tratava de pôr em prática a política econômica keynesiana, já que a produção era baixa (para vender pra quem?) assim como o consumo e, claro, a poupança. Mas em 1939 eclode a segunda guerra mundial, e o Estado norte-americano viu aí uma ótima área de escoamento da produção. Seria possível arregimentar toda aquela massa de desempregados para a produção dos bens e serviços de guerra (roupas, comidas, comunicações, carros, tanques, navios, caminhões, aviões) que seriam todos consumidos durante o período do conflito.
Após a guerra, com a economia estabilizada, a política econômica de keynesiana foi posta em prática sem demora, e adivinhem para onde foi boa parte daqueles investimentos que, para Keynes, serviriam para absorver as poupanças. Para a guerra, claro.
Mas qual guerra se, afinal, o mundo já experimentara morte e destruição suficientes, com direito a holocaustos e bombas atômicas? Ora, isso não seria problema para a propaganda governamental achar um Vietnã aqui, um Iraque ali, um terrorismo acolá, e assim deram continuidade para sua produção militar continuar vigorosa. Afinal as redes de lucro que se contraíram com conflitos poderiam dar conta facilmente do maldito dinheiro que não consome os produtos tradicionais. Lembremos do apoio militar a Israel, ao Kuwait, da venda de armas ao Afeganistão, das empresas que faturam milhões no ramo, tudo o que quebrou aquele galhão econômico para o estilo de vida americano se manter com suas poupanças e créditos.
A matéria acima não ilustra mais do que a continuidade dessa política, que em momentos de crise ganha um abono: “Mas porque falam tão mal da guerra? Ela vai gerar empregos!”. Pois é, mas não esqueçamos do que aconteceu a mais de meio século atrás, a instauração de uma política militar que aterroriza a todos, inclusive aos próprios americanos.
Enfim, não seria preciso ir muito longe para ver a guerra imaginária que nutre essa política. Sei que os “Comandos em Ação” já foram superados, mas agora temos jogos militares virtuais para a molecada ir pegando o jeito da coisa. Enjoy, kids!
Por Otávio Silvares
segunda-feira, 15 de junho de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário