terça-feira, 16 de junho de 2009

Camarada Keynes?

por Bruno de Pierro

No atual estado no qual se encontra o sistema econômico global, diversas são as palavras que se encontram e desencontram com a finalidade de formar respostas convincentes para o que se chamou de crise financeira. Evidentemente, em situações em que não se sabe de onde vem a “mão invisível” que nos atinge em cheio, cria-se um ambiente favorável à confecção de discursos, análises e pensamentos que, se por um lado procuram dar explicações, com a desculpa de “esclarecer a população em geral”, por outro lado implicam numa perigosa miscelânea de opiniões e visões, cuja difusão maior, encabeçada pela mídia, fomenta ainda mais a confusão em torno dos fatos divulgados.
Tendo em vista o estopim desta atual “recessão”, a dizer, os prejuízos ocorridos na “bolha imobiliária” estadunidense, e os fatos que acompanharam, logo depois, o desenrolar dessa crise pelo mundo, nota-se como que alguns conceitos da ciência econômico voltam à tona, ora como se fossem convocados com o intuito de confirmarem suas previsões, ora como se finalmente fossem ofertados com fatos empíricos que explicassem idéias ainda carentes de atualidade. Nesse sentido, não voltam (pois nunca deixaram de ser estudados), mas ganham posição de destaque na comunidade os escritos de Marx, Keynes, Hobson, Smith, Maquiavel, entre outros. Estão, por assim dizer, na “boca do povo”.
Mas Keynes, especificamente, mostra-se um caso interessante, pois sua teoria volta a receber olhares esperançosos, o que, numa primeira análise, pode muito bem embaraçar as idéias. Em outras palavras, é possível se ouvir por aí – principalmente depois que, nos EUA, o governo anunciou medidas que procuram colocar o Estado numa posição mais central, como forma de ajudar o capital privado a “sair dessa sem maiores problemas” – que a teoria keynesiana de intervenção do Estado volta com tudo, o que evidenciaria um grande colapso no sistema capitalista e sinais de que o socialismo é a saída. Infelizmente, não é verdade.
O erro maior está em vermos Keynes agora como um herói, no sentido de que sua teoria nos salvará colocando, finalmente, rédeas no sistema altamente liberal da economia global. Keynes sempre quis salvar o capitalismo. E, compreendamos, não há mal nisso quando se está diante de uma “grande depressão” como foi a de 1929. No entanto, apesar de se saber que o principal problema da crise diz respeito a problemas relativos à superprodução, ao crédito, ao consumo etc., é necessário abrir espaço para novas análises que nos façam enxergar mais a fundo o que de fato há de keynesiano nesse, digamos, “ressurgimento” do Estado.
No início da década de 1930, o socialismo apresentava-se numa posição de destaque perante muitos trabalhadores nos Estados Unidos, onde o sistema econômico capitalista vivia um verdadeiro colapso geral. Keynes surge exatamente para trazer à tona explicações para aquela circunstância drástica. Por meio da análise do processo de produção, ele conseguiu apontar problemas do sistema e sugerir algumas ações efetivas para reverter a situação. Tais ações seriam, então, regidas pelo Estado. Em suma, Keynes percebeu que o sistema de produção deve obedecer a uma lógica segundo a qual o valor daquilo que foi produzido deve ser igual às rendas geradas durante o processo produtivo. Portanto, as empresas devem vender tudo o que produziram, o que exige da população um potencial de consumo, ou seja, ela precisa gastar sua renda. Mas isso é muito difícil de ser conquistado; nem toda a renda distribuída na sociedade é gasta na adquirição de produtos ou serviços. Caso o fosse, os lucros seriam sempre elevados, sendo que os empresários poderiam produzir a mesma quantidade ou mais, sem precisar fazer cortes de investimentos.
O que, então, causaria os períodos de crise, de acordo com Keynes? Exatamente o fato de nem sempre as empresas poderem vender tudo o que produzem. Falamos aí de “vazamentos no fluxo circular”, que significa processos próprios do sistema capitalista que dificultam a circulação de renda e, conseqüentemente, obtenção de lucros. Uma parte da renda que deveria ser gasta com a compra de produtos disponíveis no mercado é poupada, mantendo-se de lado do “fluxo de despesas”. O problema está quando a poupança supera os empréstimos dado pelos bancos aos consumidores; os empréstimos representam uma forma de fazer com que aquele dinheiro que é poupado nos bancos seja movimentado por aqueles que não o possuem, mas precisam consumir. E, como verificou Keynes, geralmente há mais poupança do que empréstimos. Outros dois fatores decisivos para proporcionar uma recessão são as importações e os impostos.
Mas o que vale frisar aqui, para não nos estendermos demais, é que as medidas propostas por Keynes para solucionar problemas de ordem econômica tem como objetivo fundamental fortalecer a idéia de que o sistema capitalista tem viabilidade. Assim, no caso de a poupança exceder os investimentos, o que prejudicaria a produção e acarretaria em desemprego etc., o governo deveria “participar”, na forma de recolhedor do excesso de dinheiro acumulado como poupança. Caberia ao governo obter empréstimos e investir em projetos - e é aí que se pode pensar que Keynes tem uma “queda” esquerdista – sociais.


*Bruno de Pierro é o cachorro normal.

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